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Portal Estadão

Publicado em 03/09/2025 - 10:06 / Clipado em 04/09/2025 - 10:06

Da hidratação ao ritmo ideal de evacuação: as novas orientações para prevenir o câncer colorretal


As duas medidas serão apresentadas no Congresso Brasileiro de Coloproctologia e somam-se a outros quatro pilares já defendidos pelos médicos; a expectativa é que, em conjunto, esses hábitos possam reduzir em até 30% o risco de câncer de intestino


Por Fernanda Bassette
 

Beber mais água e evacuar com regularidade podem parecer atitudes simples, mas elas têm impacto direto na prevenção de uma das doenças que mais cresce no Brasil: o câncer de intestino. Por isso, a Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP) anunciará essas duas novas recomendações contra a doença durante o 73º Congresso Brasileiro de Coloproctologia, que acontece em São Paulo a partir desta quarta-feira, 3.

O câncer colorretal já ocupa o posto de segundo tumor mais prevalente no País e é o terceiro que mais mata. Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), são esperados 45.670 novos casos apenas em 2025. A Fundação do Câncer projeta que, até 2040, o número pode aumentar em 20%, chegando a 71 mil diagnósticos anuais.

Diante desse cenário, especialistas reforçam a importância da prevenção primária, ou seja, de investir em hábitos reconhecidamente capazes de reduzir o risco de surgimento da doença. Já existem quatro pilares consolidados: alimentação equilibrada, manutenção do peso adequado, prática regular de atividade física e abandono do cigarro – além da atenção a sinais como sangue nas fezes e da realização da colonoscopia a partir dos 45 anos.

Agora, essas duas novas orientações passam a integrar a lista de comportamentos protetores: ingerir água em quantidade maior do que a habitual (três litros por dia, em média) e evacuar regularmente, pelo menos a cada 48 horas – caso isso não aconteça, a recomendação é procurar um médico.

Segundo a coloproctologista Carmen Ruth Manzione Nadal, membro da comissão de prevenção do câncer colorretal da SBCP e médica que apresentará as novas indicações durante o congresso, a sugestão de beber cerca de dois litros de água por dia foi baseada em estudos realizados em países de clima mais ameno.

“No Brasil, especialmente em regiões mais quentes, precisamos ingerir volumes maiores de água, chegando a três litros por dia, dependendo da temperatura e da atividade profissional. A hidratação adequada é essencial para que as fibras da alimentação cumpram sua função no intestino, formando um bolo fecal mais volumoso e de consistência pastosa, o que facilita as evacuações”, justifica.

A especialista alerta ainda que a constipação não deve ser encarada como algo banal. “Evacuar pelo menos a cada 48 horas é fundamental. Caso a pessoa tenha intestino preso, deve procurar atendimento médico para investigar e tratar a causa, já que a constipação é considerada um fator de risco para o câncer colorretal”, destaca.

O cirurgião do aparelho digestivo Flávio Kawamoto, coordenador do Instituto de Obesidade e Diabetes do Hospital Moriah, concorda e acrescenta: “Evacuações frequentes, em média uma vez ao dia ou pelo menos a cada dois dias, reduzem o tempo de permanência das fezes no intestino e, consequentemente, o contato da mucosa intestinal com produtos da digestão que podem ter potencial carcinogênico”, afirmou.

O coloproctologista Rodrigo Oliva Perez, head do Núcleo de coloproctologia e intestinos do Centro Especializado em Aparelho Digestivo do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, reforça: “Já era de conhecimento geral que hábitos saudáveis estão associados à redução do risco de câncer colorretal. Essas duas novas duas recomendações vêm em consonância com as anteriores, promovendo a saúde do cólon. A pessoa que se alimenta, se exercita e se hidrata bem tende a ter um intestino que funciona melhor e, portanto, é menos sujeita a desenvolver lesões”, afirma.

O presidente-eleito da SBCP, Olival de Oliveira Junior, concorda e complementa: “As recomendações antigas foram revisadas e ajustadas para o momento atual. Ter boa alimentação, controlar o peso, fazer atividade física, não fumar, ingerir líquidos adequadamente e ter evacuações regulares são primordiais para reduzir o câncer colorretal. Vários estudos já demonstram que dieta rica em fibras e líquidos diminui a chance de desenvolver a doença”, descreve o médico.

Seguindo essas seis orientações básicas de prevenção, a SBCP estima que o risco de câncer intestinal pode ser reduzido em até 30%. “São medidas simples, baratas e eficazes, que poderiam se tornar diretrizes governamentais de saúde pública para combater uma doença tão prevalente”, resume Carmen.

Alimentação em destaque

A dieta balanceada continua o eixo central da prevenção. Segundo Carmen, uma alimentação balanceada rica em frutas, verduras, legumes, cereais integrais e leguminosas ajuda o intestino a funcionar melhor. “É importante também reduzir a ingestão de carne vermelha e embutidos, além de evitar ultraprocessados ricos em aditivos, sódio e gordura.”

A médica aconselha uma divisão prática do prato: uma porção de arroz e feijão ou macarrão, uma de carne do tamanho da palma da mão, uma de verduras verdes e outra de legumes variados.

O Inca sugere o consumo de, no máximo, 500 gramas de carne vermelha cozida por semana. Ou seja, o ideal é que os filés bovinos apareçam de duas a três vezes por semana no menu. Para especialistas, é válido abrir espaço para peixes e aves, opções que concentram muitos nutrientes e costumam apresentar menor teor de gordura saturada.

Apesar dos avanços no conhecimento sobre prevenção, o Brasil enfrenta obstáculos para o diagnóstico e tratamento da doença. Hoje, estima-se que cerca de 60% a 70% dos casos de câncer colorretal são diagnosticados em estágios avançados, quando o tratamento é mais difícil e as chances de cura diminuem. Quando a doença é detectada em fase precoce, as chances de cura superam 90%.

Entre os fatores que explicam essa realidade estão o desconhecimento da população sobre a doença e seus sinais, o acesso limitado ao sistema público de saúde, erros diagnósticos no início dos sintomas e a ausência de um programa nacional de rastreamento sistemático (incluindo a realização do exame de sangue oculto nas fezes e o encaminhamento para colonoscopia, por exemplo).

O aumento na incidência da doença, inclusive entre os mais jovens, é atribuído a múltiplos fatores: envelhecimento populacional, sedentarismo, consumo excessivo de álcool e tabaco, dietas pobres em fibras e ricas em ultraprocessados, além da obesidade. “O nosso estilo de vida atual, com alto consumo de gorduras e alimentos industrializados, aumenta o risco de mutações no cólon e desenvolvimento de tumores. A população jovem já está exposta a esses fatores desde cedo”, diz Carmen.

Segundo Perez, do Oswaldo Cruz, exames de rastreamento, como a colonoscopia, continuam sendo fundamentais. “Aliado a hábitos saudáveis, o rastreamento oportuno permite identificar lesões precursoras que podem ser removidas antes de evoluírem para tumores, aumentando muito as chances de cura”, conclui.

 

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