Publicado em 22/11/2023 - 11:50 / Clipado em 22/11/2023 - 11:50
USP e Unicamp se mantêm na liderança do RUF 2023
A USP (Universidade de São Paulo) e a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) ganham de novo o primeiro e segundo lugares do RUF (Ranking Universitário Folha), respectivamente.
A diferença entre USP (nota 98,85) e Unicamp (nota 98,20) é de apenas 0,65 ponto, em uma escala até cem.
Suspenso na pandemia, o ranking retorna após quatro anos. Nesta nona edição, traz uma avaliação inédita de todas as 203 universidades ativas (públicas e privadas) e dos mais de 18 mil cursos presenciais oferecidos nas 40 carreiras de maior demanda no país.
Desde 2012, a iniciativa classifica as melhores universidades e cursos. As instituições são avaliadas a partir de cinco indicadores: qualidade do ensino, pesquisa científica, mercado de trabalho, inovação e internacionalização.
A dupla paulista se destaca no topo, ampliando a distância, que era de 0,9 ponto em relação às demais, para quase 2 pontos. USP e Unicamp ocupam a dianteira em pesquisa científica. A Unicamp, pela primeira vez, lidera no indicador de ensino. A USP segue à frente nos demais, em especial, em contratações do mercado de trabalho paulistano.
Menos de metade das matrículas no ensino superior resulta em diploma no Brasil. A dificuldade financeira em se manter na universidade é o fator mais citado por alunos e especialistas como motivo de desistência, mas pesam também as deficiências de aprendizado trazidas do ensino médio, a falta de orientação acadêmica e a desilusão com o curso.
Os dados de trajetória estudantil do Censo do Ensino Superior 2022, do MEC (Ministério da Educação), dão mais detalhes. A desistência é maior no ensino particular que no público, homens abandonam a formação mais que mulheres, mais velhos desistem mais e a concessão de bolsas de assistência reduz a evasão.
“Para estar na universidade você precisa pagar a passagem de ônibus, se alimentar, ter onde morar, senão não se mantém”, diz Manuella Mirella, presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes).
Com a expansão do ensino superior e a democratização das vagas públicas com o sistema de cotas e o Sisu, “a universidade passou a receber outro estudante”, de acordo com Maria Angélica Minhoto, professora de educação da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e coordenadora de pesquisa do SoU_Ciência, que possui um blog na Folha.
“A educação fica mais cara com estudantes mais carentes, e nem são só os cotistas. O povo empobreceu nos últimos anos. Precisa de restaurante universitário, computador, moradia, assistência à aluna que é mãe“, diz ela, citando temas que também estavam entre as reivindicações das greves estudantis de outubro na USP (Universidade de São Paulo) e Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Para as federais, existe o Pnaes (Plano Nacional de Assistência Estudantil), que distribui bolsas e financia bandejões, estabelecido por decreto de 2010. Plano semelhante para as públicas estaduais, o Pnaest foi criado também em 2010, mas descontinuado.
O censo rastreou a desistência de alunos da rede privada com bolsa do Prouni e mostrou que ela foi muito menor se comparada aos que não tinham bolsa (40% contra 60%, para turmas ingressantes em 2013). O mesmo aconteceu com quem tinha o Fies (49% contra 62% de quem não tinha).
O levantamento analisou ainda a trajetória da primeira turma de beneficiados nas federais após a criação da Lei de Cotas, por dez anos. Os resultados iniciais foram positivos: a desistência foi menor (36%) entre cotistas, seja de escola pública ou PPI (pretos, pardos e indígenas), na comparação com quem não teve reserva de vaga (55%).
“São alunos motivados, que ambicionaram entrar na universidade pública”, diz a professora Marta Arretche, do Departamento de Ciência Política da USP. “Há uma diferença de desempenho que nem é muito grande e diminui com o tempo. Esses alunos valorizam muito o diploma e não é raro que haja todo um esforço familiar em torno deles.”
A dissertação de mestrado defendida em junho por Luis Pedro Polesi de Castro e orientada por Arretche no departamento destaca outras causas, como a deficiência de aprendizado trazida do ensino médio e o mau desempenho nas notas no primeiro ano de curso.
É esse fator que transforma a área de exatas em campeã da evasão. Física e matemática são as licenciaturas com taxas mais elevadas de desistência (72% e 67%), mostra o censo.
“Eu não tinha preparo”, conta Giovana Nogueira Rodrigues, 23, que desistiu do primeiro curso em que entrou. Ao se formar no ensino médio na escola técnica estadual, ela passou no Enem em ciência e tecnologia na Universidade Federal do ABC, orgulho para a família. No primeiro mês, diz, percebeu que não sabia fazer conta de fração.
“O primeiro ano é o grande momento de desistência. O aluno tem dificuldade para acompanhar, porque vem do ensino básico público. O que muitas universidades fazem é um esforço de apoio, em matemática, língua portuguesa”, afirma Lucia Teixeira, presidente do Semesp, entidade que representa as mantenedoras de ensino superior.
Só que os professores universitários não têm treinamento pedagógico, e a falta de orientação para alunos com dificuldade é um entrave à superação das deficiências.
A decepção com o curso é mais um fator. “Tive um grande baque entre a expectativa de lidar com a construção de aviões e a realidade de um ciclo básico em engenharia, com matérias que pareciam estar lá só por obrigatoriedade”, conta Victor Renzo, 23, que abandonou a engenharia aeronáutica na Escola de Engenharia de São Carlos (USP).
Na segunda tentativa, o curso de ciências moleculares também na USP, o que pesou foi o ambiente acadêmico. “Tem a questão financeira, mas também tenho vontade de construir uma carreira mais cedo e ter uma atividade com mais impacto real.”
Atualmente ele cursa engenharia da computação na Poli (Escola Politécnica), da mesma universidade, tentando equilibrar esses dois aspectos.
A alocação de disciplinas mais específicas no início e as atividades de extensão junto à comunidade são iniciativas citadas para responder ao anseio de uma universidade mais prática, tecnológica e voltada ao mercado de trabalho.
O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), do MEC, recolhe e analisa dados sobre a evasão, mas não é um cálculo simples. O índice é medido a partir da matrícula. Transferências são contabilizadas como dados negativos.
Com as limitações da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), o instituto não faz mais a contagem individual.
O quadro fica mais claro se visto de forma retroativa. Por isso, no último censo, o Inep escolheu analisar a turma que entrou na faculdade em 2013, encontrando, em média, 58% de desistência. Só que naquela época o cenário era outro, sem a disseminação de cursos privados a distância e com as cotas apenas começando a ser colocadas em prática.
“Os indicadores de trajetória acompanham vários cortes até, em geral, o dobro do tempo mínimo de conclusão do curso”, segundo a assessoria de comunicação do Inep.
Em termos de desistência, há diferença entre cursos. Os mais disputados, como Medicina, têm evasão mais baixa que aqueles com muitas vagas. Uma estatística geral conta apenas parte da história.
“O Inep também está concluindo uma metodologia de tratamento para o cálculo do indicador por instituição de educação superior, que será divulgado ainda em 2023 e possibilitará análises a partir da perspectiva das instituições”, afirma a assessoria.
Pelas normas da educação superior, as universidades brasileiras devem ser todas iguais. Acontece que, na prática, essas instituições são bem diferentes entre si —o que tem de ser considerado pela política do setor.
Explico. Uma instituição centenária como a USP —líder no RUF 2023— tem questões muito distintas do que, por exemplo, universidades jovens e distantes de grandes centros. E isso precisa ser levado em conta, como já acontece em uma série de países.
No ranking deste ano, no mesmo grupo da USP, um total de dez universidades públicas se mostraram especialmente intensas em pesquisa. Cientistas vinculados a elas publicaram pelo menos 10 mil artigos no período de 2016 a 2020.
São instituições estaduais paulistas e federais com mais de 50 anos localizadas no eixo Sul-Sudeste (a exceção é a UnB, do Centro-Oeste). Fazem muita ciência —e ajudam a colocar o Brasil entre os maiores produtores de pesquisa científica do mundo.
Essas universidades, aliás, sempre estiveram no topo do RUF desde a primeira edição do ranking, em 2012, em uma espécie de alternância.
Estamos falando de USP, Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e Unesp (Universidade Estadual Paulista) e de pelo menos seis federais, UFRJ (Rio de Janeiro), UFMG (Minas Gerais), UFRGS (Rio Grande do Sul), UFSC (Santa Catarina), UFPR (Paraná) e UnB.
São essas, afinal, as nossas “universidades intensas em pesquisa”. Essa definição existe na China desde 1998, com a criação, pelo governo, da Liga das 9 (C9 League, em inglês). É um grupo de instituições públicas que recebe aportes especiais para fazer pesquisa de ponta altamente internacionalizada.
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