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Portal Folha de S. Paulo

Publicado em 03/11/2023 - 07:38 / Clipado em 06/11/2023 - 07:38

A gente quer Ciência, Educação e Arte


Uma homenagem a Danilo de Miranda que abriu caminhos que seguiremos trilhando

 

 

 

Soraya Smaili

Maria Angélica Minhoto

Pedro Arantes

SÃO PAULO

 

 

A partida de nosso querido amigo Danilo Santos de Miranda nesta semana, nos fez refletir sobre sua história e atuação em favor da Arte e da Cultura e como o SESC-SP que ele criou pode inspirar as universidades brasileiras. O Professor Danilo, como era conhecido por muitos, foi muito reconhecido pela sua dedicação às artes, mas seu legado vai além, como pensador-experimental do Brasil que queremos. Danilo soube muito bem como integrar Arte e Cultura com Lazer e Esportes, e também com a Educação e Pesquisa, o que se tornou evidente com a criação do Centro de Pesquisa e Formação do SESC-SP. Ele criou um sistema completo de experimentação aplicada em todos os níveis de um outro Brasil possível. Transformou cada unidade do SESC-SP em um pequeno "condensador social" de imaginações, corpos e identidades em busca de novas existências possíveis e desejadas.

Danilo, além do gestor visionário do sistema SESC-SP, foi certamente um grande intelectual público de nosso tempo. Foi um defensor decisivo da cultura no momento em que ela foi mais vilipendiada na história brasileira, acolhendo e apoiando artistas e grupos no momento em que o sistema de fomento à cultura no Brasil entrou em colapso pelo obscurantismo bolsonarista e pela pandemia. Nunca recuou em seus princípios, e sempre apoiou ações, exposições e apresentações provocativas ao status quo.

É exatamente a partir dessa capacidade de liderar a resistência da cultura, apoiar e valorizar o que é importante e na hora certa, que Danilo foi tão relevante para tantas pessoas. Por isso, não há o menor perigo de que sua obra seja esquecida ou descontinuada. Além disso, ele deixou uma equipe preparada para assumir integralmente as responsabilidades do sistema SESC-SP.

O sistema que ele ampliou progressivamente, incluindo mais o interesse por pesquisa, ciência, tecnologia e inovação, de forma prática, aplicada e democrática, por meio de cursos, oficinas, laboratórios, viveiros, ações comunitárias etc. Danilo sabia que Arte e Ciência, quando caminhando juntas, contribuem para a formação cidadã integral de nosso povo, com imaginação e rigor, com liberdade e compromisso. A aliança entre Arte e Ciência é o caminho para uma sociedade mais aberta e humanizada, consciente de seus problemas e desafios, numa perspectiva emancipadora.

Muitas universidades têm percebido cada vez mais a importância dessa articulação cotidiana entre arte, educação e ciência. Não são poucos os museus, os espaços culturais, memoriais que estão vinculados ao ensino e à pesquisa, mas que também são espaços de interação e ligação com a sociedade. As pró-reitorias de extensão tornaram-se de "extensão e cultura", e as artes saíram da caixinha das escolas de arte e museus e começaram a circular em todos os campos de conhecimento, semeando novas imaginações.

Alguns exemplos que podemos citar, só para mencionar alguns, são o Museu Nacional que é da UFRJ , o Memorial Darcy Ribeiro da UnB, o Memorial da Anistia da UFMG , o Museu de Arte Contemporânea da USP, o Centro Cultural em Saúde ou a Mostra Mundo Árabe de Cinema, que está na Unifesp e em processo de reconstrução. Todos eles articulam arte, educação e pesquisa. As universidades têm grupos de teatro, orquestras, grupos de música e dança, grupos performistas e coralistas, que são lugares de experimentação, de estudo e de formação humana, incluindo estudantes de todos os cursos.

Quando estivemos na reitoria da Unifesp, Danilo Miranda foi um importante parceiro. Realizamos o primeiro Acordo de Cooperação entre SESC-SP e Unifesp, concretizando um sonho de anos, fomentando diversas ações em colaboração. Algumas delas emblemáticas, como a vinda de Judith Butler, o apoio à criação do SoU_Ciência (min 7), a homenagem das Cátedras Kaapora e Sustentabilidade e Projeto Xingú ao título honoris causa a David Kopenawa, a homenagem da Cátedra Edward Said à obra do intelectual palestino, os projetos com coletivos culturais no Centro de São Paulo e em Guarulhos, o projeto com Economia Solidária etc . Danilo também esteve muito presente como representante da Sociedade Civil no Conselho Estratégico Universidade Sociedade (CEUS) da Unifesp, participando de dois mandatos, com participação intensa nas reuniões, nos apoiando nos momentos mais críticos que vivemos sob Bolsonaro.

As Universidades têm muito a aprender com Danilo. A visão de acolhimento e formação ampla e socialmente referenciada do SESC-SP, sempre de portas abertas, dando espaço a múltiplas vozes, corpos, territórios e identidades, é um exemplo para as práticas de extensão e cultura das universidades. Certamente temos outras responsabilidades como universidade, mas é inegável que a capacidade de comunicar, incluir e formar do SESC-SP é um exemplo fantástico para a abertura das nossas universidades, ainda mais, às demandas sociais e aos múltiplos saberes e formas de expressão.

Por isso, Danilo não foi apenas o diretor genial do SESC-SP por 40 anos, mas um intelectual e ativista que pode nos ensinar a renovar a identidade das universidades no Brasil e ampliar nosso diálogo, integração e colaboração com a sociedade. Para além de continuar e intensificar a parceria com o SESC-SP, pode ser provocativa uma visão que pense como hibridizar universidades com centros de cultura, esporte e lazer, com portas abertas à população. Danilo foi um visionário não apenas para o sistema SESC-SP, mas para qualquer instituição que atue com educação e cultura e queira intensamente se relacionar com a sociedade na pesquisa, imaginação e construção de um mundo melhor. Salve, querido Danilo!

 

https://www1.folha.uol.com.br/blogs/sou-ciencia/2023/11/a-gente-quer-ciencia-educacao-e-arte.shtml

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