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Publicado em 24/10/2022 - 09:26 / Clipado em 25/10/2022 - 09:26

Brasil deixa de usar quase R$ 35 bilhões na ciência de 2010 a 2021


Esses cortes afetam as bolsas de assistência estudantil para alunos de baixa renda, consideradas fundamentais para a manutenção desses estudantes na universidade.


Quase R$ 35 bilhões que deveriam ser destinados para a ciência de 2010 a 2021 ficaram “perdidos” no Orçamento federal, sendo metade disso só nos três primeiros anos do governo de Jair Bolsonaro (PL). Corrigida pela inflação, o valor equivale hoje a cerca de R$ 45 bilhões.

O cálculo, inédito, foi apresentado pela pesquisadora Soraya Smaili, uma das criadoras do Centro de Estudos SoU_Ciência, ligado à Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), instituição que ela comandou, como reitora, por oito anos. O centro é apoiado pelo Instituto Serrapilheira.

Para chegar aos números, os pesquisadores ligados ao centro tiveram como base o valor arrecadado e pago pelo FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) desde 2010. Criado por lei em 1969, o FNDCT é o principal instrumento público de financiamento de ciência, tecnologia e inovação do Brasil, alimentado por um fluxo contínuo de recursos obtidos por meio de tributos específicos.

Essa arrecadação tem aumentado nos últimos anos. Para se ter uma ideia, foram R$ 2,9 bilhões levantados pelo fundo em 2010 e R$ 10,3 bilhões no ano passado (em valores sem reajuste da inflação).

O problema é que o repasse total do FNDCT para a ciência diminuiu no mesmo período: passou de cerca de R$ 2,7 bilhões em 2010 para R$ 1,4 bilhão em 2021 (sem reajuste da inflação).


Histórico

Desde 2010, de acordo com os dados levantados pelos cientistas no Siop (Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento), R$ 34,9 bilhões do FNDCT deixaram de ser repassados para a ciência brasileira.

Destes, R$ 17,7 bilhões não foram repassados nos três anos iniciais do governo de Jair Bolsonaro (2019 a 2021). “Não sabemos exatamente o que aconteceu com esses recursos”, diz Smaili.

Os recursos federais destinados à ciência também foram ceifados de outras maneiras nos últimos anos.

Segundo dados do mesmo Siop, em valores corrigidos pela inflação, as universidades federais perderam 45% da verba destinada às chamadas “outras despesas correntes”, como pagamento de água, de energia e de prestação de serviços de terceiros (como segurança e limpeza), por exemplo.

Esses cortes afetam também as bolsas de assistência estudantil para alunos de baixa renda, consideradas fundamentais para a manutenção desses estudantes na universidade pública. Os recursos foram de R$ 8,1 bilhões, em 2019, para R$ 4,4 bilhões, em 2022 (até setembro).

“Os estudos e levantamentos do Sou Ciência têm mostrado grande queda nos recursos das 68 universidades federais, especialmente entre 2019 e 2022, prejudicando laboratórios, pesquisadores e infraestrutura de pesquisa”, diz Smaili.

Ao mesmo tempo em que sofre cortes federais, a ciência brasileira ganhou mais confiança da população no período.


Prejuízo

Para Smaili, a pandemia aproximou a ciência da população de uma maneira sem precedentes, mas os cortes de recursos nas atividades científicas vão fazer a academia “perder esse bonde”. “Temos uma janela de oportunidade para engajar a sociedade pela ciência. Essa campanha tem de ser constante.”

Os dados foram apresentados pelo SoU_Ciência em uma mesa sobre política científica, que fechou o evento de comemoração de cinco anos do Instituto Serrapilheira, no Rio de Janeiro.

Nesses cinco anos, cerca de R$ 60 milhões foram investidos em ciência e divulgação científica pela instituição –que é privada. “É apenas uma gota no ecossistema científico. A verba pública é o coração do apoio à ciência”, diz Hugo Aguilaniu, presidente do instituto.


Texto: Sabine Righetti (FolhaPress)


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