Publicado em 21/10/2022 - 07:36 / Clipado em 21/10/2022 - 07:36
Verbas de custeio caem 45% e investimento despenca 50% em universidades federais no governo Bolsonaro
Os sucessivos cortes de recursos para a ciência e a educação ao longo dos últimos 4 anos atingiram especialmente as universidades federais. As chamadas “outras despesas correntes”, que englobam custeio e assistência estudantil das universidades, caíram de R$ 8,1 bilhões, em 2019, para R$ 4,4 bilhões, em 2022, segundo dados do SIOP (Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento), em valores corrigidos pela inflação (IPCA). Isso representa uma queda de 45% na verba destinada ao pagamento de água, energia, bolsas de estudo e prestação de serviços, por exemplo. O levantamento foi feito pelo Sou Ciência (Centro de Estudos Universidade, Sociedade e Ciência da Unifesp), em parceria com o Instituto Serrapilheira.
A análise mostra ainda que o investimento nas universidades federais caiu 50% entre 2019 e 2022, chegando a R$ 97,5 milhões em setembro deste ano. Em todo o ano de 2021, foram investidos apenas R$ 129 milhões. Esses recursos são aplicados no patrimônio das universidades, como aquisição de imóveis e terrenos, reformas e obras, além de compra de equipamentos, computadores, livros e materiais permanentes.
A série histórica dos últimos 22 anos aponta que o ano de 2014 teve o maior volume de investimentos já registrado (R$ 1,5 bilhão). Assim, houve uma redução de 94% ao longo dos últimos oito anos.
“Os estudos e levantamentos do Sou Ciência têm mostrado grande queda nos recursos das 68 universidades federais, especialmente entre 2019 e 2022, prejudicando laboratórios, pesquisadores e infraestrutura de pesquisa. O apoio de entidades, como o Instituto Serrapilheira, é importante, porém é necessário que o Estado brasileiro se responsabilize e dê suporte para que as universidades possam continuar produzindo”, afirmou Soraya Soubhi Smaili, coordenadora do Sou Ciência e professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Os novos recortes foram feitos a partir do painel sobre o Financiamento da Ciência e Tecnologia e da Educação Superior Pública, que compila informações de bases de dados oficiais do governo federal, e apresentados na 6ª edição do Encontros Serrapilheira. O evento reúne até quarta-feira (19) pesquisadores e divulgadores científicos apoiados pelo Instituto Serrapilheira, no Rio de Janeiro.
“O Brasil tem cientistas excelentes, mesmo com as condições precárias para pesquisa e a instabilidade orçamentária. Imagina do que eles serão capazes quando a ciência se tornar de fato uma política de Estado, e não apenas de governo, recebendo o devido valor”, disse Hugo Aguilaniu, diretor-presidente do Instituto Serrapilheira.
Na apresentação, Soraya mostrou ainda o aumento da diferença entre a dotação atual (arrecadação) do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e o valor liquidado (reembolsável e não reembolsável). Enquanto em 2010 a diferença era de 32,8%, em 2021 a disparidade chegou a 90%, como mostra o gráfico abaixo.
Outro dado compilado pelo Sou Ciência mostra que a diferença entre os valores pagos e arrecadados pelo FNDCT foi de R$ 44 bilhões (valores atualizados) em 12 anos.
“Os recursos do FNDCT são compostos de taxas e impostos e por lei deveriam ser aplicados em Ciência e Tecnologia, apoiando não só universidades, como institutos de pesquisa, públicos e privados. Mesmo sem esses recursos, temos feito grandes contribuições para a sociedade brasileira, como foi mostrado na pandemia. Imaginem o que nossas universidades e institutos poderiam fazer se os recursos fossem integralmente aplicados. Estaríamos produzindo mais conhecimento para saúde, biotecnologia, agricultura, preservação de águas e florestas, energias sustentáveis, ciência da computação, entre tantas outras atividades que auxiliariam no crescimento econômico e social do País. O que vimos foi o contrário: dificuldades e desmonte”, pontuou Soraya.
Neste contexto, o Serrapilheira, instituição privada, vem se firmando nos últimos 5 anos como uma entidade importante no apoio aos cientistas. Mais de R$ 60 milhões já foram investidos desde 2017 em ciência e divulgação científica. No final de agosto, o Instituto abriu novo edital para jovens cientistas, com mais R$ 9 milhões previstos e uma parceria com as fundações de amparo à pesquisa.
“O Serrapilheira é apenas uma gota no ecossistema científico. Sabemos que a verba pública é o coração do apoio à ciência, embora, nos últimos anos, o instituto tenha ganhado relevância porque o orçamento público da ciência diminuiu muito. Por sermos um instituto privado e termos mais liberdade para experimentar, o Serrapilheira tem, portanto, a função de ser também um laboratório de práticas inovadoras que podem ser implementadas pelo poder público, tanto em nível estadual, como é o caso das FAPs, como federal”, afirmou Aguilaniu.
O Instituto tem defendido ainda a inclusão do tema da ciência no debate eleitoral por meio de campanhas voltadas para a sociedade e interlocução com candidatos.
“A ciência brasileira se encontra neste momento em uma situação extremamente preocupante de desmonte, e caberá ao próximo governo a sua recomposição estrutural e orçamentária, que devolva aos cientistas um ambiente propício para desenvolverem suas pesquisas”, concluiu Aguilaniu.
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