
Publicado em 27/03/2022 - 08:00 / Clipado em 27/03/2022 - 08:00
No 97º aniversário, Represa Billings já perdeu até 15% da capacidade com poluição
Amanda Lemos
Não é de hoje que a Represa Billings, um dos maiores mananciais da Região Metropolitana, se tornou alvo do descarte irregular de esgoto doméstico não tratado, detritos e poluentes, o que tem comprometido a qualidade da água e a capacidade de armazenamento da represa. Para se ter ideia, em razão do descuido do poder público e da população, de 2015 para cá, o reservatório chegou a perder de 10% a 15% de sua capacidade, conforme explica a bióloga, Marta Marcondes, professora e pesquisadora da USCS (Universidade Municipal de São Caetano).
O aniversário do manancial é neste domingo, 27 de março, mas apesar da data, a coordenadora do projeto IPH (Índice de Poluentes Hídricos) avalia que há pouco o que comemorar, uma vez que, dia após dia, a poluição aumenta e a capacidade do reservatório é ainda mais desperdiçada. “Estamos em uma situação bastante complicada. Apesar de o reservatório ser grande – com quase 150km de espelho d’água e sete compartimentos – cada ponto enfrenta uma situação bastante delicada de poluição”, diz.
Em entrevista ao RDtv, a docente afirma que o monitoramento da qualidade da água foi iniciado há sete anos, quando também foi constatada a perda da capacidade. “De lá pra cá só perdemos, ano após ano”, avalia. “Como os compartimentos do sistema se conversam, a exemplo do braço do Rio Grande que recebe esgoto de Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, Santo André e São Bernardo, por mais diluído que seja – o esgoto não é tratado e, assim, atinge toda estação de tratamento de água”, explica.
Diante disso, a pesquisadora explica que por mais que o trabalho da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) seja comprometido no tratamento da água, não é possível tirar todos os poluentes existentes. “Não se tem equipamentos e estações modernizadas para a retirada de micropoluentes (poluentes emergentes)”, frisa. “Não temos essa tecnologia e, além do esgoto doméstico, há uma série de outras substâncias que chegam nos esgotos, como: poluentes industriais, antibióticos, hormônios, além de material sólido, que compromete a capacidade do reservatório”, lembra.
O que também preocupa Marta são as ocupações localizadas nas margens da represa. “Temos muita ocupação irregular. E o despejo de detritos nas águas ocasionado por essas pessoas, especialmente situada nas regiões dos braços do Rio Grande, Taquacetuba e Bororé levam à decantação do fundo do reservatório”, pontua a especialista ao citar que os despejos afetam, ainda, a qualidade da água que é entregue à população. “Por isso a recomendação é para que as famílias tenham, pelo menos, os filtros de barro dentro de casa”, orienta.
Em razão das ocupações, outro ponto negativo destacado por Marta é o desmatamento no entorno da Represa. “Quando você tem desmatamento nas áreas mananciais, o lugar que ficou sem vegetação começa a ser escoado para o fundo do solo, o que também compromete a capacidade da Represa”, explica a pesquisadora. Exemplo disso é o braço do Rio Grande, que já registrou perda de 800 metros de profundidade em razão do desmatamento. “A melhor solução pra isso seria uma fiscalização integrada do Reservatório e suas áreas do entorno, mas precisa de força de vontade para acontecer”, avalia.
Na avaliação do advogado e assessor jurídico do MDV (Movimento em Defesa da Vida do Grande ABC), Virgílio Alcides de Farias, a degradação da Represa tem como maior responsável o governo do Estado, que deixa de fiscalizar e aplicar ações protetivas no manancial. “Quem mais polui é quem deveria fiscalizar a Represa”, afirma. “O Estado, através da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), passou 10 anos na discussão da aplicação de uma lei específica para ação integrada envolvendo Estado e prefeituras, mas o prazo para aplicação da lei venceu em janeiro de 2010”, conta.
‘Bebemos esgoto’
De acordo com Farias, desde então nenhuma ação efetiva foi colocada em prática e, ano após ano, o dano ambiental impacta consideravelmente o manancial que abastece a região. “As nascentes que formavam a Represa Billings foram destruídas, e hoje, o que forma o manancial, é esgoto puro. Não bebemos água tratada, bebemos esgoto tratado”, diz ao criticar a falta de comprometimento do governo do Estado com o tratamento e manutenção da Represa.
Mesmo com os tantos problemas citados pelos especialistas, Marta diz que ainda há um ponto a se comemorar neste domingo (27/03). Em meio ao caos e poluição, ainda existem locais na Billings onde a qualidade da água tem se mantido em níveis bons, a exemplo dos braços Rio Pequeno, Capivari e Rio das Pedras – todos no ABC. “Onde não há ocupações e tanta poluição dá para ver a fauna da Billings”, relata.
A professora lembra que a data serve para conscientizar a população sobre os cuidados com o manancial. “Quando se ama, tem que cuidar e preservar. A Represa completa seus 97 anos, e assim como uma senhora de idade com seus 97 anos, tem que ser respeitada e cuidada” frisa. A bióloga reforça, ainda, que este é um dever de responsabilidade conjunta. “Todas as cidades e esferas precisam ter esse cuidado. É um grito, um apelo para unirmos forças por um bem comum”, afirma.
Veículo: Online -> Site -> Site Repórter Diário - Santo André/SP
Seção: Meio Ambiente