
Publicado em 03/10/2024 - 17:26 / Clipado em 03/10/2024 - 17:26
Candidatos a prefeito elencam 700 propostas para Saúde nos planos de governo
Wilson Moço
Mapeamento feito pelo Repórter Diário mostra que 31 dos 33 candidatos a prefeito da região elencaram em torno de 700 propostas ou ações nos programas de governo registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no eixo Saúde. Dois nomes que concorrem ao Paço de São Bernardo, somados, respondem por aproximadamente 170 das promessas elencadas: Luiz Fernando Teixeira (PT) aparece na ponta, com cerca de 100, e Alex Manente (Cidadania) vem em seguida, com aproximadamente 70. Na outra ponta está o candidato do Democracia Cristã à Prefeitura de Ribeirão Pires, Aarão Teixeira (Democracia Cristã), que não inclui nenhuma proposta no documento.
Outros dois candidatos colocaram apenas uma proposta no documento registrado no TSE, um deles é Tite Campanella (PL), que aparece na liderança nas pesquisas de intenções de voto divulgadas até o momento na disputa em São Caetano. No entanto, ele não segue a linha adotada pela maioria dos demais pleiteantes da região, que tratam de cada promessa ou ação de forma específica. No caso do liberal, o enunciado dá tratamento mais genérico ao tema.
“A saúde e o bem-estar de nossa população são pilares fundamentais para o desenvolvimento de uma sociedade próspera e justa. Reconhecemos que investir em saúde é investir no futuro de São Caetano do Sul, garantindo que todos os cidadãos tenham acesso a serviços de qualidade, prevenção eficaz e atendimento humanizado. Nosso compromisso é transformar São Caetano em um modelo de saúde pública, onde cada pessoa receba cuidados integrados e contínuos”, expõe no documento.
Outro candidato que traz apenas uma proposta é Claudio Donizete (PSTU), de São Bernardo, que propõe uma mudança radical no sistema de saúde pública da cidade. “Fim da privatização da saúde municipal! Concursos públicos, já. Que os hospitais e UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) sejam controlados pelo poder público, com a participação de conselhos populares”, destaca, em crítica ao modelo atual, que mantém contratos com OSs (Organizações de Saúde contratadas para assumir serviços de saúde).
O fim de contratos com OSSs também está na pauta de outros candidatos do chamado bloco da esquerda mais radical, caso de Clenilza (PCO), que concorre ao Paço de Santo André, como consta do plano de governo. “A saúde pública deve ser colocada a serviço dos trabalhadores. Primeiro, é preciso garantir que nenhuma empresa privada tome controle do SUS, como acontece com as OSs. O serviço de saúde público deve ser completamente estatal”, defende. Professor Rafinha (Psol-São Caetano) e Amanda Bispo (UP-Mauá) também colocam a proposta na relação registrada no TSE.
Convidado pelo Repórter Diário para avaliar as propostas dos candidatos, o presidente do Sindicato dos Médicos do ABC (Sindmed ABC), José Roberto Cardoso Murisset, apontou que a questão não são OSs estabelecidas, que atuam respeitando as legislações, como contratar profissionais pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas terceirizações ou até quarteirizações sem vínculo nenhum, por vezes sem um contrato formal. Para ele, é praticamente impossível encerrar contratos com OSs, porque há risco de prejudicar ainda mais o atendimento por falta de profissionais, o que já é uma das principais reclamações de usuários que recorrem à rede pública nas sete cidades.
“Na realidade o problema são as terceirizações sem vínculo nenhum, pois muitas vezes o vínculo é com uma cooperativa, uma firma, em que o indivíduo não tem nem contrato, é colocado como fazendo parte societária da empresa, e muitas vezes nem sabe que é sócio. Então, existe esse tipo de terceirização, que são, vamos dizer, predatórias. E também os contratos de PJ (Pessoa Jurídica), e algumas OSs não contratam diretamente o médico, mas uma firma que pejotiza os médicos, e outros profissionais, mas médicos sobretudo, e aí fica o PJ da PJ e não raras vezes o médico não recebe os honorários e não tem para quem reclamar. Esse tipo de terceirização, a precarização do vínculo, que deve ser combatido. Quando se fala nisso, é em relação à precarização do trabalho médico, à precarização do vínculo, sem garantia nenhuma. Em geral as OSs fazem, as grandes OSs, contratos de CLT, dando as garantias. O que se fala em acabar são as terceirizações, que muitas vezes são quarteirizações ”, esclarece
Murisset explica que o problema de terceirização e pejotização se agravou também no sistema público de saúde a partir da aprovação e implementação da reforma trabalhista de 2017, que abriu caminho para contratação de profissionais sem o chamado registro em carteira, norma regida pela CLT. Para exemplificar, lembrou que a Fundação do ABC (FUABC), instituição que gerencia e opera unidades de saúde em várias cidades, dentro e fora da região, mantinha em torno de 3.500 profissionais contratados pela CLT trabalhando em São Bernardo, Santo André, São Caetano e Mauá. Número que hoje gira em torno de 1.900. “Depois da reforma trabalhista intensificou a terceirização na forma de PJ. Enfim, é cooperativa, falsas cooperativas, um monte de coisas. Esse é o cenário hoje.”
MESMA LINHA
No entanto, quando se esquadrinha as cerca de 700 propostas elencadas para nortear os quatro anos de mandato dos prefeitos eleitos para assumir em 1º de janeiro de 2024, é possível verificar que algumas medidas constam de praticamente todos os documentos, algumas de maneira mais detalhada. Como já observado em outros eixos dos planos de governo, verbos como apoiar, ampliar, implementar, criar, construir, garantir, elaborar, revitalizar, reforçar, reformar, estimular e fortalecer estão entre as mais usadas para iniciar o enunciado de uma proposta.
Assim, entre as propostas elencadas em todos os planos de governo estão reforma, revitalização, construção e ampliação de UBSs (Unidades Básicas de Saúde), UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) e hospitais, como do Idoso, da Mulher e Infantil, além de equipamentos de atendimento às mulheres, como o Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism), e criação ou ampliação de programas destinados ao público feminino.
“Li as propostas de todo mundo, e no geral são muito semelhantes? Aumentar unidades, mais UPAs, mais UBSs etc. Mas tem pouca coisa assim de novidade. É assim, sempre no sentido de aumentar, aumentar, é agradar um pouco a população, mas a gente sabe que do ponto de vista técnico a construção dos equipamentos tem de ser analisada de uma forma mais epidemiológica, dos índices epidemiológicos, da necessidade realmente básica da população da região onde será será instalado, o que é mais importante. Uma coisa que é referência, mas também precisa ter a contra-referência, que é citada em uma das propostas, acho que do Luiz Fernando, mas também tem algo parecido em outras. Ou seja, para onde a Unidade Básica de Saúde vai encaminhar os pacientes que ali passam e que precisam de atenção especializada em todas as doenças, como pneumologia, por exemplo. Ou seja, referência e contra-referência, e por isso é muito importante ter um hospital de retaguarda geral”, discorre.
Outro tema que merece atenção dos candidatos envolve a população com Transtorno do Espectro Autista (TEA), cujo atendimento (ou falta de) tem sido alvo de reclamações em praticamente todas as cidades da região, por falta de profissionais especializados em neuropediatria, o que impacta no fornecimento de laudos que atestem o problema e permitam o acesso a medicamentos e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Pais também apontam a ausência de espaços para tratamento, que inclui sessões de fisioterapia.
Quase todos candidatos falam da questão do transtorno do espectro autista. Não é que estejam errados, mas existem outras doenças que são mais endêmicas, mais preocupantes, em nível de saúde pública. Não que a questão do autismo não seja importante, mas não são citadas porque aí não vai dar ibope. Vai falar de tuberculose, de hanseníase e de outras doenças, e mesmo de doenças crônicas, como hipertensão, diabetes, AVC, hipertensão ou cardíacas etc etc?”, pontua Murisset.
O presidente do Sindmed ABC destacou ainda outras duas propostas que chamaram sua atenção nos planos de governo dos candidatos. A primeira, que trata da criação do chamado Poupatempo da Saúde, modelo que já funciona em Santo André, considera que poderá ter papel importante na rede de saúde pública desde que o serviço não seja interrompido por um motivo outro, como pelo alto custo que pode envolver sua manutenção. “Mas se o poupatempo da saúde facilitar o acesso, porque um dos gargalos da saúde é justamente o acesso, e também as necessidades imediatas que são buscadas no atendimento, como exames, medicamentos, procedimentos mais simples, tudo isso vai ser importante. Se funcionar ao longo do tempo, porque não adianta funcionar bem um, dois anos, e depois se deteriorar ou fechar, por ser muito caro, tem tudo para se consagrar.”
A segunda trata de uma promessa de longa data de candidatos, e prefeitos eleitos, que ele considera que ainda não se concretizou: criação de prontuário eletrônico de todos os pacientes atendidos na rede pública de cada cidade, de modo a permitir que seja acessado em todas as unidades de saúde. “Outra velha cantilena é que vai implantar prontuário eletrônico em todos os níveis, mas isso já se fala há 20 anos e ainda não ocorreu. E todo ano de eleição aparece, e sem dúvida seria o ideal, e infelizmente isso não ocorre. Mas todos (candidatos) têm nas suas plataformas, nos seus programas de governo”, avalia.
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Seção: Saúde