
Publicado em 02/10/2024 - 08:50 / Clipado em 02/10/2024 - 08:50
Ex-cinturão vermelho, ABC paulista resiste à volta do PT
São Bernardo deixou de ser comandada pelo partido em 2016, após oito anos de governo, em meio à onda antipetista que se fortaleceu com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff
Por Victoria Abel — São Paulo
“É o candidato a prefeito do Lula, é o único com conexão direta com Brasília. Aqui é São Bernardo, é a terra do presidente Lula”. O locutor no carro de som repetiu a frase dezenas de vezes durante um percurso de quatro quilômetros no centro de São Bernardo do Campo, berço político do presidente. A carreata levava o candidato Luiz Fernando (PT) na caçamba de uma camionete. Enquanto acenava e fazia o L com os dedos, o petista buscava olhares de apoio entre comerciantes e trabalhadores do bairro; a maioria respondia com educação, mas poucos se empolgavam.
A cidade no ABC paulista deixou de ser comandada pelo PT em 2016, após oito anos de governo, em meio à onda antipetista que se fortaleceu com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Somou-se a isso o enfraquecimento do movimento sindical a partir da reforma trabalhista, em 2017. Com Lula de volta à Presidência, o PT vê a chance de recuperar o fôlego não só na cidade, mas em outros municípios que antes formavam em São Paulo o cinturão vermelho.
— Os anos 2016 e 2020 foram o fundo do poço para nós. A partir de 2022, esse cenário começa a mudar com a eleição de Lula. Para nós, é muito simbólico retomarmos São Bernardo. Para o Lula é muito simbólico. O presidente estará aqui antes do primeiro turno, dá para fazer um comício antes do dia da eleição — disse o candidato à prefeitura de São Bernardo do Campo pelo PT, Luiz Fernando, antes de saber que o presidente optaria por participar apenas de mais uma agenda antes de domingo, na capital com Guilherme Boulos (PSOL).
Ajuste no discurso
Para compensar a ausência de Lula, Luiz Fernando contou com a presença do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, seu correligionário, que tem participado ativamente da campanha.
Mesmo com a perda de força política do movimento operário nas montadoras automotivas do ABC, Luiz Fernando vai com carro de som para a entrada das fábricas às 5h da manhã, na troca de turno, estratégia comum nos anos 1980.
Para o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Moisés Selerges, esse modelo de sindicato não corresponde mais à realidade:
— Precisamos mudar rapidamente, representar o MEI, o trabalhador em home office. Não vamos deixar de acordar em porta de fábrica, mas precisamos olhar para frente.
A previsão era de que Lula fosse a São Bernardo no sábado, mas o presidente cancelou as agendas. Pesquisas internas feitas por partidos que disputam a eleição mostram Luiz Fernando tecnicamente empatado com outros três candidatos de centro-direita: Alex Manente (Cidadania), Marcelo Lima (Podemos) e Flávia Morando (União), esta sobrinha do atual prefeito, o tucano Orlando Morando.
O PT conseguiu manter o comando de apenas duas grandes cidades no entorno da capital paulista: Mauá e Diadema, também no ABC. Nesses municípios, as chances de vitória são mais concretas, mas pesquisas sugerem um segundo turno em ambas.
Em Santo André, a situação é mais difícil. O candidato do atual prefeito, Gilvan Jr. (PSDB), está isolado na liderança, conforme sondagens internas. A petista Bete Siraque está empatada no segundo pelotão com outros dois adversários. O PT avalia que há risco de Gilvan vencer já no primeiro turno. Com exceção de São Bernardo, as demais cidades não esperavam a visita de Lula, mas cobram a presença dele em caso de segundo turno.
— Lula sempre faz falta, mas contamos com ele no 2º turno. Vai ter que vir no 2º turno — disse Romulo Fernandes, dirigente do PT em Mauá,
Já em São Caetano do Sul as chances são ainda mais remotas. Jair Meneguelli aparece em quarto lugar, com baixo índice de intenção de voto, segundo levantamento dos partidos. A cidade tem histórico mais conservador e jamais teve um prefeito petista.
O presidente estadual do PT, Kiko Celeguim, avalia que o partido sofre com a falta de lideranças e de um movimento de massa. O dirigente destaca ainda que o perfil do eleitor da região mudou.
— A gente vive uma dificuldade de encontrar lideranças, igual bananeira que já deu cacho. Ou existe, em algumas cidades, um conflito geracional. Você tem lideranças jovens querendo chegar e as antigas que não saem. Esse é um problema da esquerda no mundo todo. A reforma trabalhista desorganizou o movimento sindical; o mercado de trabalho está mais informal ou uberizado — avaliou Celeguim.
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Seção: Eleições 2024