
Publicado em 29/05/2024 - 17:34 / Clipado em 29/05/2024 - 17:34
Operadoras cancelam mais planos de saúde de autistas na região
George Garcia
Praticamente todas as semanas surgem novos casos na região de pacientes com autismo que têm seus planos de saúde cancelados unilateralmente pelas operadoras de saúde. As maiores operadoras estão promovendo cancelamentos em massa, dos planos coletivos, por empresas ou por grupos, aqueles onde há uma segunda empresa como administradora. Esta semana foi a vez do cancelamento do plano de Davi Marabiza Silvério, de 5 anos de idade, autista nível 1. A operadora não explica as razões do cancelamento.
Em todo o País cresceu 31% o número de reclamações por cancelamento unilateral de planos que chegaram à ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). A mãe de Davi, Patrícia Marabiza Alves Silvério, não sabe como fará para manter as terapias, ela entrou com um mandado de segurança com pedido de liminar para garantir o atendimento. A liminar foi concedida na tarde desta quarta-feira (29/05). Essa já não é a primeira vez que ela tem que recorrer ao Judiciário para ver o direito do filho reconhecido.
No ano passado a Unimed tentou suspender o tratamento da criança na clínica que atende o menino em Santo André e em julho Davi só continuou no mesmo local por força de outra liminar. “Queriam transferir ele para uma clínica com menos recursos, eu não aceitei e busquei a liminar. Agora, eu entrei em contato com o departamento específico dentro da Unimed, que cuida de pacientes com liminares, dizendo que eles não poderiam cancelar um plano que estava sob liminar, que isso seria um descumprimento, mas eles disseram que eu que procurasse meus direitos, assim eu fiz”.
Patrícia diz que os planos de outras crianças que fazem terapia na mesma clínica ou já foram cancelados ou os pais já receberam a notificação. Também não houve cumprimento de prazos para a comunicação de cancelamento do plano. Segundo Patrícia o comunicado recebido foi de que o plano seria cancelado primeiro no dia 10, depois outro informou o dia 15, mas o plano teria sido cancelado no dia 7. O plano de Davi é daqueles em que há uma administradora do grupo, essa modalidade é a que mais tem sido prejudicada com os cancelamentos unilaterais.
Até o fechamento desta matéria a Unimed não se posicionou. A administradora diz apenas que seguiu os trâmites legais e que o cancelamento partiu da operadora. “A decisão de cancelamento não partiu da Qualicorp. Na condição de administradora de benefícios, a Qualicorp – após ser notificada do cancelamento pela operadora Unimed Nacional, enviou a carta de cancelamento aos clientes cumprindo o prazo de 30 dias de antecedência, de acordo com contrato firmado entre as partes, ratificado pelo artigo 23 da Resolução Normativa n° 557/2022, da ANS. A Qualicorp apoia seus beneficiários disponibilizando informações e orientações sobre o exercício da portabilidade, conforme o portfólio disponível e regras de comercialização das operadoras”, diz a nota da empresa.
Mediação
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) recebe denúncias e intermedia os conflitos entre os usuários e as operadoras de saúde. Somente neste ano foram 5.888 denúncias (até abril) número 31% maior do que os 4.495 atendimentos no mesmo período do ano passado.
Em nota, a ANS diz que “Para uma melhor compreensão sobre cancelamento e rescisão unilateral de contratos e sobre o exercício do direito à portabilidade de carências, a Agência sugere a leitura de nota disponibilizada em seu portal sobre o assunto. Clique aqui para acessá-la. A Agência desataca que atua de forma pioneira na intermediação de conflitos entre beneficiários e operadoras por meio da Notificação de Intermediação Preliminar (NIP). A NIP é uma ferramenta criada pela Agência para agilizar a solução de problemas relatados pelos consumidores e que conta com alta resolutividade. Por meio dela, a reclamação registrada nos canais de atendimento da Agência é automaticamente enviada à operadora responsável, que tem até cinco dias úteis para resolver o problema do beneficiário nos casos de não garantia da cobertura assistencial e até 10 dias úteis em casos de demandas não assistenciais. Se o problema não for resolvido pela NIP e se for constatada infração à legislação do setor, será instaurado processo administrativo sancionador, que pode resultar na imposição de sanções à operadora, destacando-se, dentre elas, a aplicação de multa”, informa a agência reguladora.
Especialista diz que não podem cancelar plano de autistas
Para o advogado especialista em Direito em Saúde e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Autistas, da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), subseção de São Caetano, Felipe Augusto Gomes Pereira, as operadoras não podem fazer o cancelamento de planos enquanto o paciente estiver em tratamento. “A lei que rege os planos de saúde diz não pode interromper o plano enquanto o paciente está internado, mas o entendimento do STJ (Superior Tribunal de Justiça) diz que atendimento deve ocorrer até a alta médica”, afirma.
A ementa da tese firmada no STJ aponta: “A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida”. Para Pereira é clara a determinação de que o plano não pode ser cancelado para os pacientes autistas que precisam do tratamento de forma ininterrupta, como também pacientes oncológicos e outros. “Os planos sustentam que podem cancelar porque isso não vai representar um risco imediato à vida do paciente, mas não é isso que diz o entendimento da Justiça, que diz que deve-se manter o tratamento até a alta médica. Mesmo assim estão cancelando convênios de autistas, de gestantes e até de pacientes com cirurgias marcadas”.
O desequilíbrio financeiro dos contratos de grupos é também uma das justificativas apresentadas por algumas empresas, mas isso não é suficiente para justificar o cancelamento, segundo o presidente da comissão da OAB. “A análise de risco eles não apresentam, apenas analisam o caso de cada beneficiário se ele vai custar mais caro, mas o grupo tem uma série de outras pessoas e nem todos vão demandar tantos atendimentos, ou seja, eles têm lucro, e mesmo se não tivessem esse é o risco do negócio, mas estão querendo transferir esse risco para o beneficiário do plano”, diz o advogado.
O especialista em Direito em Saúde diz que o autista tem ainda a seu favor a Lei Brasileira de Inclusão, que garante igualdade de direitos. Além disso não se pode limitar o número de terapias. “A ANS até já determinou isso, que não se pode impor um limite de terapias, o autista tem direito a todas, mesmo assim tentam limitar. Essa questão dos cancelamentos virou uma demanda nacional, até o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), já entrou na história e fez um acordo com as operadoras para a suspensão destes cancelamentos”, completa Felipe Augusto Gomes Pereira.
Essa negociação na Câmara Federal aconteceu em meio ao clima para a instalação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), um pedido feito pelo deputado Aureo Ribeiro (Solidariedade). O pedido já tem 238 assinaturas, ele precisa de 300 para ser protocolado, o autor quer apresentar o pedido na próxima semana.
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Seção: São Caetano