
Publicado em 22/01/2024 - 18:45 / Clipado em 22/01/2024 - 18:45
Qual é o time de São Paulo que já foi vice da Libertadores e mira voltar à elite do futebol?
Jorge Machado abandona profissão de agente de futebol após trabalhar com nomes importantes, como Felipão, para comprar clube e iniciar projeto ambicioso
Por Marcius Azevedo
As histórias surgem naturalmente durante o papo de quase uma hora. São personagens como Rivaldo, Ronaldinho Gaúcho, Felipão... Jorge Machado construiu uma imagem de credibilidade como agente no futebol. Mas ficou desgostoso com os rumos que sua profissão tomou e decidiu que era o momento de mudar de lado e ter o seu próprio clube. Há um mês, o empresário de 62 anos efetivou a compra do São Caetano, equipe que teve ascensão meteórica no começo dos anos 2000 e que foi ladeira abaixo na mesma velocidade até acumular uma dívida de R$ 72 milhões e ficar perto de encerrar suas atividades.
“Essa norma (da Fifa) de outubro matou praticamente todo o agente de futebol. Não dá para ganhar apenas 3% e ter de sustentar 100, 200 jogadores para acertar um. Não tem mais condição financeira, perdemos uma fatia importante para os advogados”, explicou Jorge Machado. A polêmica foi tão grande que a Fifa suspendeu temporariamente suas decisões. Mas não foi apenas isso que pesou na decisão de abandonar uma função que exerceu por tantos anos. “Hoje tem muita gente para dar opinião, influenciar o jogador, família, namorada, e, na maioria das vezes, são pessoas despreparadas.”
Jorge Machado garante que não existe conflito de interesse ao comprar o São Caetano. Ele explicou que se afastou totalmente da empresa que criou para atuar no futebol, que vai ficar sob responsabilidade do ex-jogador Bismarck. Vai se dedicar 100% para recolocar o clube novamente nos holofotes do futebol. O time do ABC surgiu para o cenário nacional em 2000 ao chegar à final da Copa João Havelange, competição criada para ocupar o lugar do Brasileirão, quando perdeu para o Vasco. Foi outra vez vice no ano seguinte e, em 2002, foi derrotado pelo Olimpia, do Paraguai, na decisão da Libertadores. A maior conquista veio em 2004, no Campeonato Paulista.
Mas por que o São Caetano? “Aqui não existe pressão. Qual SAF tem o melhor resultado no Brasil? O Bragantino, porque não existe pressão. Fora do Brasil funciona da mesma maneira. É mais fácil comprar um time que está na terceira divisão e recuperá-lo até chegar na primeira. Basta ver o sucesso do modelo do futebol do México. Veja Cruzeiro, Botafogo e Vasco e o que eles estão passando?”, comparou. “Onde eu chegar com o São Caetano vou deixar uma cidade feliz.”
O São Caetano é uma Sociedade Limitada Unipessoal desde 2003. Jorge Machado adquiriu o time do ABC do empresário Manoel Sabino Neto. A princípio, ele havia sido convidado para cuidar apenas da gestão do futebol, mas o seu antecessor, que comprou o clube de Nairo Ferreira de Souza em maio de 2021, foi preso sob acusação de participar de um esquema de lavagem de dinheiro e outros delitos no comércio popular de São Paulo, localizado na região do Brás, preferiu se afastar após ser solto para cumprir prisão domiciliar e isso facilitou o negócio.
“Fizemos um acordo para eu cuidar do futebol e ficar com 50% do resultado. Vim para cá, me apaixonei pela cidade. Com essas dificuldades na vida particular e outras situações do recomeço da vida dele, nós iniciamos uma conversa e fechamos um acordo para eu tocar o São Caetano sozinho”, explicou Jorge Machado.
O empresário tem acertado os salários atrasados dos funcionários e contratou um escritório de advocacia para renegociação das dívidas com processos trabalhistas, cíveis e tributários, buscando um prazo de pagamento flexível de até 10 anos. “Quando eu cheguei, tínhamos uma dívida de R$ 72 milhões e agora já está negociada em R$ 33 milhões”, afirmou. Preocupado? “Esses valores são pequenos para o futebol”, acrescentou.
REVELAÇÃO DE TALENTOS
Jorge Machado vai transformar o São Caetano em Sociedade Anônima do Futebol em breve por causa dos benefícios da lei e já tem autorização da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para criação de um fundo de investimento, o Talent Discovery Fund, que seria dono de 50% da SAF, abrindo caminho para outras pessoas investirem no clube. A projeção é ter uma taxa de retorno de até 35% ao ano. O empresário vai colocar em prática no clube do ABC o que fez durante toda sua vida como agente de futebol: identificar talentos, levá-los para o São Caetano, prepará-los e então negociá-los, seja com os times de maior poder aquisitivo no Brasil ou diretamente para o exterior.
O primeiro passo é reestruturar todo o departamento de base do São Caetano, sem qualquer participação de empresas terceirizadas, como aconteceu na disputa da Copa São Paulo de Futebol Junior deste ano por causa do pouco tempo para iniciar o novo modelo. Jorge Machado pretende organizar também diversas peneiras e citou Heliópolis, considerada a maior favela de São Paulo, com um dos locais em que vai buscar talentos. “Já tenho liberdade para fazer uma peneira no Heliópolis. Nunca vi um jogo de Copa do Mundo no estádio, mas não perco os jogos das Taça das Favelas”, explicou o empresário, que citou Patrick de Paula, atualmente no Botafogo, e Marinho, do Fortaleza, como jogadores que foram descobertos por ele em favelas.
Não à toa, o primeiro elenco do São Caetano com o selo Jorge Machado de qualidade é formado por jovens em sua maioria, com alguns poucos jogadores experientes, como o zagueiro Kanu, de 35 anos, com passagem pelo futebol de Portugal e Ponte Preta, para dar suporte aos garotos. O empresário estipulou um teto salarial de até R$ 10 mil, mas o ganho médio é de R$ 3 mil. O ex-volante Axel é o treinador.
Jorge Machado também rejeitou as ofertas de equipes grandes para colocar atletas no São Caetano por empréstimo. “Todos os clubes se ofereceram para me ajudar, mas eu não quero. Uma vez o presidente do Operário de Ponta Grossa (do Paraná) me disse que não pegava jogador emprestado do Athletico (Paranaense) porque lá só tem filho de rico. Eu concordo. Se vier para cá é filho de rico que ficou pobre e não sabe para onde ir”, explicou. “Estive no CT com o (Mario Celso) Petraglia (presidente do Athletico), coisa mais linda aquilo, e ele me perguntou por que não era o maior revelador de jogadores e eu respondi que ele só tinha filho de rico”, contou. “Esses garotos têm tudo, seis refeições por dia, seis tipos de mistura, até podólogo. O que vão fazer aqui, comendo arroz com ovo e linguiça?. Ou dá certo lá ou não vira jogador.”
A jornada de recuperação planejada pelo novo dono do São Caetano começa nesta quarta-feira, quando o time entra em campo para enfrentar o Bandeirante, em Birigui, na abertura da Série A-3 do Campeonato Paulista. O plano de Jorge Machado é chegar à elite estadual em três anos. Nesta temporada, ele já quer conquistar o título da Copa Paulista, disputada no segundo semestre, para conseguir uma vaga na Série D do Brasileirão em 2025.
“Quero transformar o São Caetano em um modelo de gestão de sucesso para depois replicar em outros clubes. Confio no trabalho que estamos fazendo aqui. Não tenho medo de nada. Fui servente de pedreiro e um jogador médio. Cheguei aqui pela coragem. O dar certo no futebol está sempre muito perto de dar errado”, finalizou.
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Seção: Esportes