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 Site O Diário de Mogi

Publicado em 09/12/2023 - 07:00 / Clipado em 09/12/2023 - 07:00

Mogi estuda tarifa zero: para prefeito, modelo é tendência


Prefeitura de Mogi subsidia uma parte da tarifa de ônibus e o preço da passagem será o mesmo durante todo o ano de 2024


Eliane José
 

Atenta à tendência surgida com a queda da circulação de passageiros nos ônibus, o salto do transporte por aplicativo, e situações como a desistência de empresas detentoras de concessões em algumas cidades, a Prefeitura de Mogi das Cruzes realiza estudos para a tarifa zero. O município foi o primeiro do Alto Tietê a subsidiar parte da passagem. A medida não seria para o futuro próximo porque implica em aumento dos recursos gastos com o setor (R$ 15 milhões/ano). Um impeditivo é a responsabilidade fiscal - de onde tirar o dinheiro para zerar o pagamento nas linhas que recebem 96,6 mil pessoas por dia (2,9 milhões/mês).

O prefeito Caio Cunha, do Podemos, foi pioneiro na região a custear uma parte da passagem para não aumentar o preço e perder mais usuários na concessão mantida com duas empresas, CS Brasil e Princesa do Norte. Com menos catracas girando, ambas relatam dificuldades para cobrir o valor dos insumos, folha de pagamento, e outros custos. Em 2022, eram 140 mil passageiros/dia na cidade - hoje, com 96 mil, uma redução de 32%.

Segundo o prefeito, a tarifa zero se qualifica como tendência no Brasil. “É o que estamos vendo para atender às mudanças no modal. Antes mesmo da pandemia, a mobilidade mudou com o transporte do aplicativo que, pensava-se, iria concorrer com o táxi, mas, não, concorre é com o ônibus. Três estudantes de uma das faculdades do centro, que residem em Braz Cubas, dividam o mesmo Uber”, exemplifica Caio. Além disso, ele pondera o comportamento social: boa parte das pessoas opta pelo carro ao transporte público.

Para o ano que vem, ele afirma que não há condições financeiras para bancar o custo da passagem livre porque ele seria ainda maior porque o fim da cobrança da passagem chega a mais do que duplicar a quantidade de usuários.  Ele estuda alternativas, como a tarifa zero “em alguns dias da semana ou para atender algumas regiões da cidade. Mas, isso tudo, depende de estudo, de legalidade e de responsabilidade fiscal”, insiste.

Entre as possibilidades em estariam o atendimento inicial no final de semana (casando com a proposta discutida na Câmara, feita pelo vereador petista Iduigues Ferreira Martins – veja reportagem nesta página) ou em alguns dias da semana para atender famílias que residem em situação de maior vulnerabilidade social.

Segundo Caio, na festa para Mogi, em setembro, ele queria ter feito uma experiência, com 1 ou 4 dias de gratuidade. O valor era alto demais. O plano foi para a geladeira, mas está no radar.

Até porque o prefeito acredita que a tarifa zero será uma tendência no país e no mundo. “Há empresas entregando concessão porque não têm condições financeiras de custear a operação”, alude, comentando que o subsídio já foi adotado para garantir - não só a tarifa inalterada, mas a robustez do sistema com a compra de ônibus e outros ajustes.

Além do subsídio que segurou o preço em R$ 5 até 2025, estudantes do Enem de Mogi contam com a catraca livre desde 2022 no dia das provas.

 

De olho na vizinhança

O assunto tem alcançado expressão o aumento das cidades brasileiras com o modelo. Alguns informes apontam que a não cobrança chegou a 20 municípios. Esse passo foi  dado neste dezembro pela Prefeitura de Santa Isabel, que possui 56 mil habitantes e média diária de 1,3 mil usuários do transporte público, a primeira a abraçar a bandeira da tarifa zero.  O prefeito de São Caetano do Sul, com cerca de 165 mil moradores e 15 mil passageiros/dia (número que subiu para 51 mil), e outros conferem resultados da mesma experiência que demonstra o poder de atração popular ao ônibus após a entrada livre.

A O Diário, os prefeitos (e médicos, por coincidência), Carlos Chinchilla, de Santa Isabel, também do Podemos, como o mogiano Caio, e José Auricchio Júnior, do PSDB e à frente da cidade do ABC, contam que viram mais do que duplicar o número de usuários.

Os efeitos serão calibrados pela rotina dos moradores e a adaptação à novidade. A adesão não chega, nas duas cidades, a atrair, em escala, quem opta pelo carro, mas atende quem andava a pé, residentes de áreas mais afastadas, que passaram a vir mais para as áreas centrais, e desempregados que não tinham nem mesmo como procurar o trabalho.

Em São Caetano, Auricchio Júnior prepara mudanças para responder à alta demanda em algumas linhas e nota – mas adota certo comedimento, uma maior fluidez no trânsito e a redução na fila pelo transporte por aplicativo.

 

ALTA - Catraca livre mais do que duplicou os passageiros em São Caetano (Imagem: Divulgação/ PMSC)

 

Transporte de massa afeta, diretamente, à melhora da qualidade de vida e do ar. É menos lentidão e estresse para ir daqui até lá, e menos CO2 a contaminar o ambiente. Também pode incrementar o comércio local porque as famílias darão outro destino ao dinheiro economizado com a passagem.

No entanto, os três prefeitos observam que é preciso frear expectativas porque as realidades entre as cidades que implantaram a novidade e as demais são distintas.

No caso das três citadas, por exemplo, São Caetano tem 15 quilômetros quadrados (a penúltima em extensão territorial no Estado), Santa Isabel tem 363 km² (com forte característica rural e ocupação dispersa entre suas terras) e Mogi, 412 km² (é a 88º no ranking  em SP).

As duas cidades criaram modelos próprios para custear a passagem. Santa Isabel implantou o Fundo Municipal do Transporte, busca recursos federais e o pagamento direto do recurso do vale transporte das empresas que contratam pessoas na cidade. São Caetano está utilizando recursos próprios: cerca de 2% do orçamento.

Caio Cunha estuda alternativas. No ano passado, ele integrou um comitê de prefeitos que buscava recursos financeiros para o transporte público por meio de articulações que vinham sendo feitas com o governo de Jair Bolsonaro para que a federação quitasse o valor da gratuidade para os idosos acima dos 60 anos. Hoje, essa população corresponde,  na cidade, entre 25% a 30% dos que utilizam o sistema.

Também aposta em outras possibilidades para garimpar recursos financeiros como o uso dos créditos de carbonos em parceria com empresas que bancariam investimentos, para baratear os custos, como a compra de ônibus elétricos, que são menos poluentes e têm menor custo de operação.

Para o subsídio atual, ele já usa parte dos valores das multas, mas, lembra que o total arrecadado tem reduzido com a instalação de radares e campanhas de conscientização sobre o abuso de velocidade. “Não adianta pensar na multa para cobrir esse gasto e gerar mais um produto financeiro (mais multas) que a cidade teria de criar para bancar o ônibus”, argumenta.

Ele considera o projeto de Iduigues, tarifa livre aos domingos, interessante. Mas, afirma que, primeiro, haverá estudos porque o congelamento da tarifa já é uma medida criada para sanear o transporte. Sem isso, o morador que estaria pagando R$ 5,70, desde o ano passado. “Parece pouco, R$ 0,70, mas não é pouco se somarmos todos os dias para muitas famílias”, reforça. Em Mogi, um terço dos moradores recebe algum benefício social.

“Acho interessante para promover o acesso das pessoas, aos finais de semana, aos parques Centenário e Leon Feffer. Mas, ainda mais neste ano, próximo da eleição, quando o assunto estará na campanha, será necessário saber quanto isso vai custar e de onde o dinheiro sairá. Pensamos em fazer a tarifa zero, mas, de maneira gradativa”, indica.

 

52 domingos sem pagar

A sugestão do vereador Iduigues Ferreira Martins (foto), do PT, é instituir a tarifa zero no domingo, com recursos do Fundo Municipal do Transporte. Ele defende que os 52 domingos do ano corresponderiam a um custo de R$ 26 milhões. Para isso, ele propôs uma emenda à Lei Orçamentária Anual - o orçamento de 2024 está estimado em R4 2,7 bilhões.

Defensor da tarifa zero, o vereador também defende uma mudança no contrato com as concessionárias, que hoje recebem por quilômetro rodado, e passariam a receber pela locação dos ônibus, o que, na perspectiva do petista, que visitou a cidade de Piedade, reduziria os custos atuais (hoje, a Prefeitura paga R$ 15 mi/ano).

Para ele, mesmo ampliando aos poucos, a tarifa zero teria forte impacto social na vida dos moradores e no próprio sistema já que, aos domingos, ônibus circulam praticamente vazios.

Entre os benefícios do modelo, ele cita a dignidade humana, o incremento na circulação do dinheiro no comércio local, a oferta de lazer e sociabilidade, e até o combate ao absenteísmo na saúde: “muitas pessoas não vão às consultas e exames porque não têm dinheiro para pagar a passagem”.  Oposição ao prefeito Caio Cunha, ele acredita que a ideia tem futuro: “o prefeito tem interesse em uma bandeira popular como esta”. (E.J.)

 

Santa Isabel é a primeira

O prefeito Carlos Chinchilla, de Santa Isabel, acredita que a tarifa zero terá fôlego para perdurar e atender aos moradores que não usavam os ônibus porque o valor de R$ 8,40 (ida e volta) pesava no orçamento familiar.

Primeira do Alto Tietê, a adotar o modelo, a cidade tem linhas que ficam a 24 quilômetros do núcleo urbano, e desde a implantação da novidade, exatos 9 dias, se confirmou o esperado: “Tanto as linhas, mais próximas do centro, como as mais distantes, passaram a ser  mais usadas. Artesãos me disseram que mais pessoas estão comprando seus produtos. O resultado no comércio, ainda é cedo para avaliar. Mas, isso acontecerá”, prevê.

Foi criado um Fundo Municipal, que será preenchido com verbas federais, e fontes como multas. O modelo permitirá, diz ele, a modernização dos ônibus. Antes, o sucateamento da frota preocupava e afastava passageiros.

Chinchilla cita outro efeito: o ambiental. A cidade (que tem ampla zona rural, com estradas de terra) tem uma frota de veículos antiga. “São fuscas e outros carros que poluem mais, ou seja, haverá menos poluição”.  Também no transporte, outra “menina dos olhos” para o médico, foi o atendimento gratuito a estudantes, por um sistema de vans próprio. Antes, os alunos usavam os ônibus municipais. (E.J.)

 

O exemplo de São Caetano

Em um mês, São Caetano do Sul viu subir de 15 mil para 51 mil o total de passageiros nos bancos e corredores dos ônibus que percorrem o território de 15 km². A cidade já subsidiava uma parte do setor e implantou a tarifa zero com 100% de dinheiro municipal.  

O prefeito José Auricchio Júnior (PSDB) defende que essa política “é uma questão de dignidade humana e a expectativa é que isso se perpetue, porque há condições de trabalhar, do ponto de vista orçamentário e de operação, inclusive com a modernização da frota”. Bem avaliada, a catraca livre incomoda “um ou outro cidadão, que nota que tem mais gente no ônibus”. Sobre isso, linhas estão sendo criadas. Estudos vão aferir os reflexos, mas, no olho puro, comenta, “você já percebe que a fila do Uber diminuiu”. Outra aposta é a empregabilidade local. “Um empresário que tem 8, 10 funcionários, para o próximo, vai privilegiar o morador da cidade para não pagar o vale transporte”. A maior parte dos usuários é de curta distância, mas houve avanço do trajeto longo e no final de semana. “Moradores começam a deixar o carro em casa”, diz.

Provocado, “e se fosse um prefeito de uma cidade como Mogi, adotaria a tarifa zero?, o  prefeito usou da elegância, para evitar a resposta, mas ponderou: “Todo o gestor terá de encarar esse desafio. São Paulo, a capital, já estuda o mesmo”. (E.J.)

 

https://odiariodemogi.net.br/cidades/mogi-estuda-tarifa-zero-para-prefeito-modelo-e-tendencia-1.77001

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Seção: Transporte Público