Publicado em 26/11/2025 - 09:56 / Clipado em 26/11/2025 - 09:56
Não há comprovação de que creatina previna câncer de mama
Pesquisa citada em postagem mostrou hipótese, mas não foi conclusiva; creatina traz benefícios para a saúde, mas deve ser usada sob orientação médica
Por Milka Moura
O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. A postagem cita um estudo que analisou dados de americanos publicados na Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição (NHANES). Mas o documento não cita um câncer específico e, além disso, conclui que são necessárias mais pesquisas para explorar o potencial da creatina contra o câncer. Apesar de a creatina trazer significativos benefícios para a saúde, especialistas ouvidos pelo Verifica explicam que ainda não há comprovação de que ela seja eficaz contra qualquer câncer.
O que diz o estudo citado?
O estudo citado utilizou dados da Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição (NHANES), um levantamento com adultos e crianças nos Estados Unidos. Esse artigo tentou verificar se o consumo de creatina a partir de uma dieta (carnes, peixes) estaria relacionado a menor risco de câncer. Não há citação específica a nenhum tipo de câncer, ao contrário do que afirma a postagem checada, que destaca o câncer de mama.
Os autores reuniram dados de 2007 a 2018, com dados de 25.879 pessoas. Na seleção, foram excluídos indivíduos com idade inferior a 20 anos, grávidas, infectados com HIV ou com dados incompletos. A amostra final incluiu 12.772 homens (49.35%) e 13.107 mulheres (50.65%). Destes, 2.715 pessoas relataram ter sido diagnosticadas com câncer.
Os pesquisadores então analisaram depoimentos dos pacientes. Os autores encontraram uma correlação (associação) significativa entre a maior ingestão de creatina e o não desenvolvimento de câncer, mas não estabeleceram causalidade. Ou seja, não foi possível determinar se realmente a maior ingestão de creatina diminuiu o surgimento de câncer entre os participantes.
O próprio estudo apontou que a relação apontada pode ter sido observada por variáveis não medidas ou fatores de confusão. Por exemplo, como a creatina observada foi derivada de proteínas animais e não da suplementação como conhecemos hoje, pode ser que um indicador não observado, como o consumo de vitamina D ou de ômega-3, ou um estilo de vida mais saudável, tenha influenciado a incidência menor de câncer nos participantes.
Os cientistas concluem que geraram uma hipótese importante, mas que não conseguiram prová-la. Os autores acrescentam que são necessários ensaios clínicos rigorosos para determinar se a ingestão de creatina realmente reduz o risco de câncer.
Andreia Melo, chefe da Divisão de Pesquisa Clínica e Desenvolvimento Tecnológico (Dipetec) do Instituto Nacional de Câncer (Inca), disse ao Verifica que não há confirmação de que a creatina previna o câncer.
“Existem dados contraditórios na literatura a respeito do uso de creatina e seu efeito protetor contra o câncer. Faltam estudos prospectivos que tragam dados confirmatórios”, disse.
O médico nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran) também informou ao Verifica que “não há evidência clínica robusta de que creatina cause câncer” e que “estudos em humanos ainda não confirmam qualquer ação direta antitumoral”.
Veja o estudo abaixo (em inglês).
Os efeitos da creatina
A creatina é uma substância produzida naturalmente pelo organismo a partir dos aminoácidos glicina, arginina e metionina. A suplementação dela, segundo Ribas Filho, pode ser uma fonte de energia rápida para atividades de curta duração e alta intensidade e pode ser indicada para:
- vegetarianos e veganos;
- pessoas com concussões e lesões cerebrais;
- idosos com sarcopenia (perda progressiva de massa muscular);
- pessoas em processo de ganho de massa muscular (hipertrofia);
- quem pratica esportes de força e potência.
O uso de creatina tem vários benefícios. Entre eles:
- apoio para condições clínicas como diabetes e hipertensão arterial;
- recuperação muscular e menor dano pós-exercício;
- melhoria da saúde óssea;
- combate à sarcopenia;
- benefícios cognitivos e neurológicos
- aumento da performance física.
Segundo o presidente da Abran, quando suplementada, a creatina pode melhorar a composição corporal e a função física em pacientes com câncer.
De acordo com Andreia Melo, do Inca, não há contraindicação do uso de creatina em doses habituais para pacientes diagnosticados com câncer, em tratamento, em controle ou sobreviventes da doença.
Mas é importante destacar que o uso deve ser feito com acompanhamento médico e avaliado com cautela para grupos de risco. Se a dose ingerida for superior à indicada, pode favorecer o processo de formação de tumores, explicou Ribas Filho.
Meios para a prevenção do câncer
Não é incomum que receitas milagrosas de combate ou de prevenção ao câncer se tornem virais nas redes sociais. O apelo existe pois houve alta no número de casos da doença. Segundo o Inca, o câncer de mama é o que mais mata mulheres no Brasil. A taxa de mortalidade por câncer colorretal no Brasil subiu 47% em 20 anos.
O Estadão Verifica desmentiu muitos conteúdos falsos ou enganosos sobre o tema (veja abaixo). Mas vale destacar quais são as ações que realmente ajudam a prevenir a doença, de acordo com o Inca:
- Não fumar;
- Manter uma alimentação saudável;
- Manter o peso corporal adequado;
- Praticar atividades físicas;
- Amamentar (protege as mães contra o câncer de mama e as crianças contra a obesidade infantil);
- Fazer o exame preventivo do câncer do colo do útero a cada três anos, entre mulheres de 25 a 64 anos;
- Vacinar contra o HPV as meninas de 9 a 14 anos e os meninos de 11 a 14 anos;
- Vacinar-se contra a hepatite B;
- Evitar ingestão de bebidas alcoólicas;
- Evitar carne processada;
- Evitar a exposição ao sol entre 10h e 16h e usar sempre proteção adequada, como chapéu, barraca e protetor solar, inclusive nos lábios;
- Evitar exposição a agentes cancerígenos no trabalho (agentes químicos, físicos e biológicos).
Andreia Melo, do Inca, destaca que dieta saudável, rica em frutas, verduras, legumes, sem alimentos ultraprocessados, deve ser sempre estimulada e aliada a prática de exercícios físicos.
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