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Portal Estadão

Publicado em 23/10/2025 - 10:15 / Clipado em 24/10/2025 - 10:15

Estudo descobre que vacinas de mRNA contra o coronavírus prolongam a vida de pacientes com câncer


Pesquisa publicada na revista Nature analisou as respostas de mais de 1 mil pacientes


Por Mark Johnson
 

As vacinas contra covid-19, responsáveis ​​por salvar milhões de vidas durante a pandemia, dispararam um poderoso alarme que estimula o sistema imunológico humano contra o câncer e quase dobra a sobrevida média dos pacientes, de acordo com um novo estudo retrospectivo realizado por pesquisadores do MD Anderson Cancer Center, na Universidade do Texas, e da Universidade da Flórida.

O estudo examinou os registros de mais de 1 mil pacientes do MD Anderson que já haviam iniciado imunoterapia para câncer de pulmão de não pequenas células avançado e melanoma, um tipo de câncer de pele, comparando aqueles que receberam vacinas de RNA mensageiro (mRNA) contra o coronavírus com aqueles que não receberam.

“Esses dados são incrivelmente empolgantes, mas precisam ser confirmados em um ensaio clínico de fase 3”, diz Adam Grippin, principal autor do estudo publicado na quarta-feira, 22, na revista Nature.

Grippin, que trabalhou no projeto enquanto estava na Universidade da Flórida e agora é radio-oncologista no MD Anderson, afirma que o planejamento para um ensaio clínico de fase 3 está em andamento e a equipe espera começar a inscrever pacientes até o fim do ano.

Embora as descobertas aumentem a esperança de que os cientistas consigam desenvolver uma vacina universal e pronta para uso por pacientes com diferentes tipos de câncer, elas ocorrem em um momento difícil para a pesquisa de vacinas que usam RNA mensageiro.

Em agosto, o Secretário de Saúde e Serviços Humanos, Robert F. Kennedy Jr., anunciou que o governo dos EUA estava encerrando quase US$ 500 milhões no desenvolvimento de vacinas de mRNA, “porque os dados mostram que essas vacinas não protegem efetivamente contra infecções do trato respiratório superior, como covid e gripe”. Cientistas contestaram vigorosamente a afirmação de Kennedy.

Vacinas que utilizam RNA mensageiro, uma molécula de fita simples, instruem nosso sistema imunológico sem de fato infectar o corpo, ensinando as células a produzir uma proteína viral inofensiva. No âmbito do programa Operação Warp Speed ​​do presidente Donald Trump para combater a pandemia de covid-19, cientistas conseguiram usar a plataforma de mRNA para desenvolver vacinas menos de um ano após a detecção do vírus. O desenvolvimento de vacinas geralmente leva de 10 a 15 anos.

Mas as vacinas de mRNA não eram de forma alguma uma ideia nova. Por mais de duas décadas, cientistas investigaram seu uso contra gripe e câncer.

No estudo mais recente, cientistas analisaram quase 900 pacientes com câncer de pulmão avançado tratados no MD Anderson e descobriram que aqueles que receberam vacinas contra covid-19 até 100 dias após o início da imunoterapia apresentaram sobrevida mediana de 37,3 meses, em comparação com 20,6 meses para aqueles que não foram vacinados. Pacientes com melanoma disseminado também apresentaram melhora na sobrevida mediana quando foram vacinados.

A imunoterapia funciona liberando um “freio” que impede que uma resposta imunológica excessiva destrua células saudáveis. A liberação desse freio permite que glóbulos brancos chamados células T ataquem o câncer.

Questionado sobre a resposta ao novo estudo, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos divulgou um comunicado afirmando: “A relação risco-benefício da vacinação contra covid em pessoas com menos de 65 anos é mais favorável para aqueles com risco aumentado de covid-19 grave, incluindo grupos como os pacientes com câncer avançado analisados ​​nessa hipótese. Encerramos 22 investimentos no desenvolvimento de vacinas de mRNA porque os dados mostraram que elas não protegiam eficazmente contra infecções do trato respiratório superior, como a covid.”

Ainda não está claro por que as vacinas de mRNA se mostraram tão eficazes em despertar o sistema imunológico do corpo para a presença do câncer, mas pode ter algo a ver com o papel fundamental do RNA na evolução da vida.

“O RNA precedeu o DNA evolutivamente, então as células não gostam que o RNA do mundo exterior entre”, diz Elias Sayour, oncologista pediátrico na Universidade da Flórida e um dos autores do novo artigo. “Quando isso acontece, todos os alarmes do corpo humano disparam. O ’190′ sinaliza que estamos em apuros.”

Grippin trabalhou no laboratório de Sayour na Universidade da Flórida até 2019; ele ingressou no MD Anderson em julho de 2021.

Cientistas de ambas as instituições acompanharam os registros de pacientes do MD Anderson realizando experimentos em laboratório com modelos de camundongos e descobriram que, quando a imunoterapia foi usada com a vacina de mRNA, a combinação retardava o crescimento do tumor.

“Não é inesperado. Podemos esperar que mais dados sejam divulgados”, avalia Katalin Kariko, pesquisadora da Universidade da Pensilvânia que dividiu o Prêmio Nobel de Medicina de 2023 com Drew Weissman pelo trabalho que levou ao desenvolvimento das vacinas contra o coronavírus.

Katalin, que não está envolvida no novo estudo, conta que em maio estava na Europa conversando com outros cientistas “e eles mencionaram que a vacina contra covid tinha um efeito no crescimento do câncer”. Há cerca de 150 ensaios clínicos de vacinas de mRNA em andamento ao redor do mundo, afirma a pesquisadora, quase metade para tratamento de doenças infecciosas e muitas outras para câncer.

“As pessoas estão tentando e percebem que é fácil. É barato e você pode avançar muito rápido”, diz ela. “Vai avançar e beneficiar o paciente.”

Jeff Coller, professor de biologia e terapêutica de RNA na Universidade Johns Hopkins, que também não participou do artigo da Nature, diz que o mRNA é visto como um tratamento promissor para o câncer porque “é um produto natural do corpo humano. O mRNA é produzido pelo corpo milhões de vezes por dia e é incrivelmente adaptável”.

Ele acrescenta que o mRNA “é muito fácil de trabalhar, desenvolver, fabricar e modificar conforme necessário. Nenhuma outra terapia médica é tão adaptável”. Como exemplo, ele destaca que, no dia seguinte à determinação da sequência genômica do vírus SARS-CoV-2 pelos cientistas, os pesquisadores conseguiram desenvolver uma vacina de mRNA contra ele, embora tenham demorado meses até que as vacinas fossem aprovadas e colocadas em uso.

Grippin afirma que o caminho para a descoberta mais recente começou em 2016, quando ele e outros cientistas estavam experimentando uma vacina desenvolvida para tumores cerebrais de pacientes individuais.

“Realizamos um experimento para mostrar a importância de criarmos uma nova vacina” que correspondesse à composição específica de cada tumor. O choque veio quando eles examinaram a resposta das vacinas de controle.

Embora as vacinas de controle não tivessem nenhuma relação com a composição do tumor, elas mostraram uma resposta imunológica notável.

“Foi exatamente o oposto do que esperávamos”, diz Grippin. “Mas abriu a porta para a possibilidade de desenvolvermos uma vacina universal que pudesse ser usada para treinar o sistema imunológico de qualquer paciente a combater o câncer.”

Depois que bilhões de doses de vacinas de mRNA foram administradas para combater a pandemia de covid-19, os cientistas tiveram a oportunidade de ver como elas afetaram pacientes com câncer.

Grippin e Steven H. Lin, radio-oncologista do MD Anderson, lançaram o estudo retrospectivo de pacientes tratados entre 2015 e 2023 para determinar se aqueles que receberam vacinas contra o coronavírus viveram mais.

O fato de as vacinas não precisarem ser adaptadas individualmente para cada paciente é especialmente significativo. A criação de vacinas personalizadas contra o câncer exigiria a realização de uma biópsia do tumor do paciente e a análise de sua composição genética, um processo que levaria meses.

Sayour e outros cientistas afirmam que esperam que o novo estudo leve o governo Trump a reconsiderar a interrupção do desenvolvimento da vacina de mRNA.

“Poucas coisas foram testadas de forma tão abrangente quanto a vacina de mRNA contra a covid-19”, diz Sayour.

“Não estou dizendo que essa é a cura para o câncer, ok? Estou dizendo que é uma ferramenta, uma ferramenta que pode nos permitir melhorar significativamente a resposta à imunoterapia que estamos vendo atualmente. Quero dizer, todos os dias centenas de pacientes com câncer morrem apesar dos inibidores de checkpoint (medicamentos imunoterápicos).”

O estudo foi financiado pelo Instituto Nacional do Câncer norte-americano e por diversas fundações.

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