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Portal Estadão

Publicado em 08/08/2025 - 09:30 / Clipado em 08/08/2025 - 09:30

Imunoterapia muda a forma de enfrentar o câncer


Tratamentos que utilizam o próprio sistema imunológico são realidade para milhares de pacientes; no Brasil, o acesso ainda é desigual

 

 

Por Estadão Blue Studio
 

Reconhecida como uma das estratégias mais eficazes no combate a tumores malignos, a imunoterapia vem ampliando as possibilidades de tratamento para diferentes tipos de câncer, com destaque para melanoma, pulmão, rim e bexiga. “Essa terapia ensina o organismo a reconhecer e atacar as células tumorais, o que a torna mais fisiológica e seletiva do que a quimioterapia”, explica o oncologista Gustavo Schvartsman, do Einstein Hospital Israelita. André Fay, oncologista clínico do Hospital Nora Teixeira e professor da Escola de Medicina da PUCRS, completa a explicação: “A imunoterapia estimula ou modifica o sistema imune para que ele reconheça e ataque as células cancerígenas”, afirma.

“Quando comecei o tratamento com imunoterapia, senti como se estivesse saindo de um poço sem fundo e, de repente, começassea flutuar e subir.” - Iane Cardim, Professora aposentada

O principal mecanismo hoje envolve o bloqueio dos chamados checkpoints imunológicos, como as proteínas PD-1 e PD-L1, utilizadas pelos tumores para se camuflar da resposta imune. “Quando usamos anticorpos anti-PD-1, impedimos essa inibição, reativando a resposta imune”, diz Schvartsman. Esse processo permite que o corpo volte a identificar o tumor como uma ameaça.

Além dos inibidores de checkpoints, há outras abordagens, como vacinas terapêuticas e terapias celulares com CAR-T, que utilizam células de defesa modificadas em laboratório para atacar o câncer de forma direcionada.

Atualmente, a imunoterapia tem mais de 30 indicações aprovadas, incluindo casos metastáticos e contextos pré e pós-operatórios. “É tratamento de primeira linha para melanoma, câncer de bexiga e rim, por exemplo, e também indicada após falha da quimioterapia em outros tumores”, afirma Fay.

Impacto no tratamento

A escritora Bruna Lauer, de 39 anos, enfrentou um câncer de mama triplo negativo pela segunda vez em 2023. “Quando tratei o câncer pela primeira vez, em 2019, a imunoterapia não era indicada para meu tipo de tumor. Em 2023, ela já fazia parte do protocolo”, conta. Bruna recebeu 17 aplicações combinadas com quimioterapia e tolerou bem os efeitos colaterais. “Foi uma sensação positiva, principalmente por estar enfrentando isso novamente com mais recursos.”

“A imunoterapia ensina o organismo a reconhecer e atacar as células tumorais, o que a torna mais fisiológica e seletiva do que a quimioterapia.”

Gustavo Schvartsman, Oncologista do Einstein Hospital Israelita

História semelhante é a da professora aposentada Iane Cardim, de 56 anos, diagnosticada com adenocarcinoma de pulmão, de não pequenas células, com metástase óssea, no fim de 2015. “Na época, a imunoterapia não era uma opção. Quando entrou no rol da ANS, em 2018, 30 dias depois eu já estava em tratamento. Era como cair num poço sem fundo e, de repente, começar a flutuar”, relata. “Com a quimioterapia, eu ficava muito debilitada. Já a imunoterapia me dava disposição até para passeios após as aplicações.”

Em alguns tumores, os resultados são expressivos. “A sobrevida em cinco anos no melanoma metastático passou de quase zero para até 50% dos pacientes. Já acompanhamos casos de remissão sustentada há mais de dez anos”, diz Schvartsman.

Desigualdade de acesso

Apesar dos avanços, o acesso à imunoterapia no Brasil ainda é limitado. Apenas cerca de 25% da população tem plano de saúde, e nem todos os convênios cobrem esse tipo de tratamento — o que varia conforme o tipo de câncer e a atualização do rol da ANS. No SUS, a incorporação da tecnologia também é limitada. O custo elevado é o principal entrave: o tratamento pode ultrapassar R$ 500 mil por paciente anualmente.

A chegada de biossimilares, prevista para 2026, pode contribuir para reduzir os custos. A alternativa é a participação em pesquisas clínicas. “O estímulo à pesquisa é uma forma de oferecer terapias inovadoras a custo zero”, destaca Fay. “No Einstein, por exemplo, temos estudos que incluem pacientes do SUS, com acesso gratuito ao melhor tratamento padrão e a terapias experimentais”, complementa Schvartsman.

O futuro da imunoterapia inclui novas gerações de medicamentos, como vacinas de RNA mensageiro, moléculas bispecíficas (Bite), linfócitos infiltrantes de tumor (TILs) e novos checkpoints imunológicos. A medicina personalizada também avança, com o uso de biomarcadores capazes de prever quais pacientes terão melhor resposta ao tratamento. “Identificar quem se beneficia é fundamental para garantir eficácia e sustentabilidade”, diz Fay.

Embora os desafios persistam, há consenso entre os especialistas: a imunoterapia já transformou a oncologia. O próximo passo é ampliar as possibilidades de acesso para que mais pacientes possam se beneficiar dessa nova abordagem.

https://www.estadao.com.br/saude/imunoterapia-muda-a-forma-de-enfrentar-o-cancer/

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