
Publicado em 04/07/2025 - 09:27 / Clipado em 04/07/2025 - 09:27
Planos de saúde devem informar motivo da negativa de cobertura por escrito
Resolução também estabelece novos prazos para respostas sobre autorizações
Luana Lisboa
São Paulo
As novas regras da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) sobre o relacionamento entre operadoras e beneficiários de planos de saúde entraram em vigor na terça-feira (1º). Regulamentadas na resolução normativa nº 623/2024, elas têm foco na prevenção de falhas após o aumento expressivo de reclamações a partir de 2019, segundo a agência.
Entre as principais mudanças estão a obrigatoriedade da operadora esclarecer por escrito as razões para a negativa de uma cobertura e o estabelecimento de respostas mais rápidas para as solicitações. (Veja detalhes sobre as mudanças abaixo).
A resolução é vista por especialistas em direito à saúde como o marco de um novo modelo de fiscalização na saúde suplementar, e destacada por eles como positiva. Alguns pontos da resolução, no entanto, desagradam setores da saúde privada.
O que muda
Prazos de resposta conclusiva para autorização do procedimento
A partir de 1º de julho, o consumidor deve ser informado conclusivamente se o procedimento foi autorizado ou não nos seguintes prazos:
- Resposta imediata: urgência e emergência na forma da legislação;
- Até 10 dias úteis: procedimentos de alta complexidade ou de atendimento em regime de internação eletiva;
- Até 5 dias úteis: aplicável para os demais casos.
A resposta final é se o procedimento foi ou não autorizado, e não para o cumprimento da solicitação. Assim, a operadora não poderá utilizar termos genéricos como "em análise", "em processamento", por não ser uma resposta conclusiva.
Para as demais solicitações que não se referem à cobertura de procedimento —como reajustes, cancelamento de contrato, portabilidade—, o prazo de resposta conclusiva é de sete dias úteis.
Atendimento virtual obrigatório
Além dos canais de atendimento presencial e telefônico, que já eram obrigatórios, as operadoras deverão oferecer canais eletrônicos de atendimento, disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana, acessíveis por site, aplicativo ou outras tecnologias digitais.
Acesso à negativa de cobertura por escrito
A nova resolução da ANS afirma que a operadora deverá informar por escrito toda e qualquer negativa de procedimento, independentemente da solicitação do beneficiário. Esse documento deverá ser disponibilizado pela operadora em formato que permita sua impressão e o beneficiário deve saber sobre onde acessar essa informação.
Índice de resolutividade dos canais de atendimento
A nova norma passa a exigir que a operadora meça a resolutividade dos seus canais de atendimento. A ANS poderá requisitar informações sobre essa medição.
Além disso, a ANS passará a reconhecer as operadoras que se destacarem em boas práticas, por meio de metas de excelência e redução do Índice Geral de Reclamações (IGR). O desempenho poderá influenciar na aplicação de sanções.
Sobre esse ponto, a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde) manifestou, em nota, preocupação e defendeu o adiamento da resolução por 12 meses, alegando que apenas no dia 6 de junho a agência publicou esclarecimentos importantes para a sua aplicação. A resolução foi publicada em dezembro de 2024.
"O objetivo do requerimento é garantir ao setor tempo necessário para adaptar sistemas e processos complexos com segurança e responsabilidade, e assim evitar impactos indesejados no atendimento aos beneficiários", diz em nota.
A Fenasaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), em comunicado, defendeu que a adoção das regras e eventuais sanções sejam feitas de forma gradual pela ANS, alegando que mantém aspectos que exigem "complexas alterações operacionais para que a integração dos diferentes canais de atendimento seja feita sem perda da qualidade do serviço prestado".
Benefícios aos usuários
Apesar de, no primeiro momento, as novidades representarem dificuldades para as operadoras, as alterações devem ser discutidas pelos envolvidos, pelo fato de que a norma traz questões procedimentais relevantes, afirma o advogado Lucas Miglioli, sócio do M3BS Advogados.
Para Marina Paullelli, advogada do programa de saúde do Idec (Instituto de Defesa de Consumidores), a resolução é um avanço para melhorar o atendimento do consumidor, até por também incluir as administradoras de benefícios —empresas que fazem a intermediação da gestão de planos coletivos—, que também são alvo de reclamações.
"Apesar dos avanços, a resolução será somente eficaz se as empresas, de fato, se comprometeram a solucionar dúvidas e problemas de consumo de forma extrajudicial, sem a necessidade de uma ação na Justiça. Além disso, outros tópicos da regulação setorial precisam ser alvo de avanço, como a regulação de planos coletivos, que precisam ter mais proteção contra reajustes abusivos e rompimentos imotivados", diz.
Em ranking publicado este ano pelo Idec, os planos de saúde lideram as queixas entre os serviços, em especial por dúvidas e reclamações sobre reajuste abusivo (25,85% dos casos). Depois, seguem os problemas com contrato (19,49%). Práticas abusivas (cancelamento unilateral de contrato e exclusão de dependentes) e negativas de cobertura ficam empatados em terceiro lugar, com 13,14% das queixas cada.
Para o advogado Caio Henrique Fernandes, sócio do Vilhena Silva Advogados, especializado em direito à saúde, o estabelecimento do acesso à negativa por escrito pode ser uma causa para o aumento da judicialização de casos, por permitir que haja uma prova contundente para uma ação judicial.
Ele defende que ANS proteja o beneficiário de plano de saúde, inclusive com a aplicação de sanções para isso. "Nós estamos falando de uma pessoa vulnerável na relação, um consumidor, que precisa ter alguém que fiscalize aquilo que a operadora exerce. Então, a ANS precisa ter meios para coibir a abusividade, um deles sendo a sanção."
Já Miglioli afirma que, muitas vezes, a judicialização acontece por falta de comunicação. "Muitas vezes, por não saber a exata razão da negativa, que por vezes está de acordo com o contrato, o cliente propõe uma ação judicial. Com a comunicação clara, ele pode entender o que está acontecendo. Acho que essa norma vai mitigar a quantidade de ações", diz.
Veículo: Online -> Portal -> Portal Folha de S. Paulo