Clipclap

Aguarde ...

 Site Valor Econômico - São Paulo/SP

Publicado em 09/08/2022 - 07:46 / Clipado em 09/08/2022 - 07:46

Parcerias procuram ampliar acesso à internet nas escolas


Projetos apoiados pelo investimento social privado envolvem conexão, capacitação de docentes e ensino médio profissionalizante


Por Denise Neumann — Para o Valor, de São Paulo


No Brasil, 60% das escolas públicas municipais do ensino fundamental não possuíam internet dirigida ao ensino e aprendizagem em 2021, enquanto nas escolas estaduais esse percentual era de 26%, segundo dados do censo escolar 2021 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O impacto negativo dessa carência tecnológica na inclusão social é ainda mais gritante quando a ela se soma a falta de preparo do corpo docente para transformar as novas tecnologias em aliadas dentro das salas de aula. Diante dessa realidade, que regionalmente é ainda mais desigual, diferentes projetos de investimento social privado têm atuado com foco no acesso das escolas públicas à internet e no desenvolvimento de competências digitais de educadores e estudantes.

Sempre em parceria com o setor público, a Fundação Telefônica Vivo foca na capacitação de professores e alunos, enquanto o Instituto Claro mistura formação e conectividade e o Instituto Escola Conectada se concentra em conectar as escolas à rede, em alta velocidade. Vivo e Claro também apoiam um curso profissionalizante para alunos do ensino médio.

O Brasil tem quase 47 milhões de alunos no ciclo básico e 2,2 milhões de professores. Por isso, Américo Mattar, diretor-presidente da Fundação Telefônica Vivo, pondera que o investimento social privado não vai “conseguir escala e sustentabilidade se não for trabalhando junto com o Estado”. Daniely Gomiero, diretora de comunicação corporativa e responsabilidade social da Claro e vice-presidente de projetos do Instituto Claro, segue a mesma concepção: “Quando conseguimos fazer a conexão entre o privado e as políticas públicas, ganhamos escala”.

As três experiências partilham da percepção de que os mais de R$ 8 bilhões que podem ser mobilizados para conectar escolas nos próximos cinco anos (R$ 3,1 bilhões das obrigações do leilão 5G, R$ 3,5 bilhões do fundo de telecomunicações para conectar alunos e professores, além do Programa de Inovação Educação Conectada) demandarão o complemento de políticas públicas que potencializem competências digitais nos alunos das escolas públicas. Sem isso, a desigualdade sócio-digital evidenciada durante a pandemia da covid-19 tende a aumentar.

A Fundação Vivo, explica Mattar, escolheu atuar no campo das tecnologias digitais por essa área fazer parte do negócio da Vivo e a empresa perceber, em seu próprio dia a dia, que faltam profissionais preparados. Para Mattar, “é quase paradoxal” que 30% dos jovens estejam desempregados e existam 80 mil vagas abertas (com potencial para serem 500 mil em quatro anos) na área de tecnologia. Disposta a atuar para mudar essa realidade, a fundação mantém uma plataforma de cursos para a formação continuada de educadores, que capacita 65 mil professores por ano, e montou um curso de ciência de dados para alunos do ensino médio, em parceria com três Estados (Mato Grosso do Sul, Espírito Santo e Santa Catarina), com 300 alunos em 15 escolas.

Mattar explica que o currículo desse curso foi formatado junto com as secretarias estaduais e a partir da escuta a mais de cem empresas para entender qual o perfil de profissional que elas buscavam. O curso é técnico-profissionalizante e a Fundação Vivo, além de apoiar os Estados na formatação do currículo e na formação dos professores, também atuou para criar a própria profissão de técnico em ciência de dados, que só existia em nível superior. Embora o piloto do curso seja nos três Estados, agora nada impede que outros governos utilizem seu conteúdo para montar cursos semelhantes. “Nossa ambição é que esse conteúdo, enquanto uma política pública e dentro da reforma do ensino médio, possa ser oferecido para qualquer aluno e qualquer região do Brasil”, disse Mattar.

O outro foco da Fundação Vivo é ajudar a repensar a escola à luz das tecnologias digitais. Mattar pondera que dar um equipamento para um aluno ou conectar uma escola não significa que ele vai aprender pelo simples fato de ter acesso tecnológico. “Precisamos trabalhar com os professores para que eles estejam familiarizados com novas práticas”, observa. A plataforma da fundação busca desenvolver competências digitais dos educadores e apoiar o uso de novas tecnologias e novas formas de ensinar em conteúdos de diferentes disciplinas. Existem cursos que podem ser acessados gratuitamente por qualquer professor, e outros que são montados em parceria com as secretarias de ensino, a partir de demandas que elas levam para a fundação.

Processo semelhante é mantido pelo Instituto Claro, mas com foco em secretarias municipais de ensino e acompanhado da garantia de conexão das escolas à internet. Por meio do Educonexão, cujo projeto-piloto foi implementado em 2011, o instituto está hoje em 1.800 escolas de 56 cidades, espalhadas em 20 Estados. Já foram formados 2,8 mil professores e coordenadores pedagógicos, em uma capacitação que demanda oito meses. Daniely Gomiero conta que o instituto acompanha de perto essa formação e analisa 50 indicadores diferentes de práticas educacionais. “Acompanhamos o pré, o durante e o pós para entender os resultados e mensurar se a capacitação de fato fez diferença na vida do professor e ele conseguiu utilizar os conteúdos”, explica a vice-presidente do Instituto Claro.

Nas 1.800 escolas, explica Gomiero, a Claro também garante a conexão dos espaços de ensino à internet. “A ideia é que seja um recurso da educação e não da administração”, explica. O Instituto procura os municípios a partir de uma lista de indicadores educacionais e sociais, e eles precisam se comprometer com o projeto, mas não há repasse de recurso financeiro.

O Instituto Claro também mantém o dupla escola, projeto que nasceu em 2014 de uma parceria com a Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro, interessada em retomar a oferta de cursos profissionalizantes. Alunos regulares do ensino médio na região de Guaratiba estudam à tarde no Colégio Estadual Hebe Camargo, para serem técnicos de telecomunicação. São 130 vagas anuais e 710 jovens já foram formados. “Eles saem com registro de técnico em telecomunicações no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea)”, conta ela. “Não é uma simples capacitação, são três anos intensos estudando telecomunicações”, reforça a vice-presidente do Instituto Claro. Alguns dos alunos já foram contratados pela própria Claro. “O principal dado de sucesso desse projeto, principalmente considerando a realidade de vulnerabilidade desses jovens, é que temos evasão zero”, avalia a executiva, ressaltando que 60% dos alunos são mulheres.

Ao contrário dos projetos da Vivo e da Claro, o Instituto Escola Conectada não trabalha com projetos pedagógicos. Todo o foco está na conexão das escolas à internet de alta velocidade, conta Marcos Pinheiro, diretor-executivo do Instituto, uma organização não governamental fundada pelos sócios da Datora Telecom. O Instituto atua fazendo a ponte entre juntando provedores locais de internet e escolas da sua área de atuação que ainda estejam desconectadas, garantindo internet 100% gratuita por um período inicial de três anos. “No país, 25% das escolas públicas ainda não estão conectadas, e entre as que estão, só 14% possuem internet suficiente para boas práticas pedagógicas”, diz Pinheiro. “São 140 mil escolas sem internet, mas na porta delas passa um provedor. Nosso trabalho é fazer essa ponte”, explica.

Desde 2020, 65 escolas onde estudam 30 mil alunos foram conectadas e outras 97 escolas estão em processo de formalização da parceria. A previsão é chegar ao fim do ano com 100 mil alunos beneficiados. As escolas interessadas podem se inscrever no site do instituto e a organização também faz procura ativa de governos municipais ou escolas. Depois de feita a ponte e a internet ser instalada, o Escola Conectada monitora a conexão e o uso.

E embora o foco do instituto seja conectar escolas, o “sonho” de seus criadores é que, até 2025, todas as 140 mil escolas do país estejam ligadas à rede, considerando os mais de R$ 8 bilhões que podem ser usados para esse objetivo. Mas o trabalho não vai acabar, e sim ganhar novos desafios, a valia Pinheiro. “O papel da sociedade civil vai ser na manutenção, no aprimoramento desse ecossistema e no apoio aos gestores para o bom uso da tecnologia”, acredita o diretor-executivo do instituto.


https://valor.globo.com/empresas/noticia/2022/08/09/parcerias-procuram-ampliar-acesso-a-internet-nas-escolas.ghtml

Veículo: Online -> Site -> Site Valor Econômico - São Paulo/SP