Publicado em 31/10/2025 - 13:41 / Clipado em 31/10/2025 - 13:41
Especialista defende ‘backup’ no sistema de água e manutenção programada para evitar colapsos no RJ
''Precisamos tratar esse tema de grande relevância, que requer investimento em obras para que tenhamos a redundância do sistema e a garantia de abastecimento'', diz Miguel Fernández, presidente do CREA-RJ
O presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio (CREA-RJ), o engenheiro civil Miguel Fernández — mestre em Engenharia Urbana pela UFRJ, com especialização em recursos hídricos e saneamento — puxou o freio de alerta no SANEARio: é hora de investir em manutenção programada e criar redundância, um verdadeiro “backup” do sistema de abastecimento do Rio de Janeiro.
“A gente precisa tratar esse tema de grande relevância, que requer investimento em obras para que tenhamos a redundância do sistema e a garantia de abastecimento. Você não pode deixar um único local fazendo esse abastecimento, pois, se falhar, haverá paralisação geral e um grande caos”, afirmou Miguel Fernández, durante o painel “Gestão Metropolitana, regulação e clima”, no Teatro Adolpho Bloch, na Glória. O evento é realizado pela ABES-RJ e contou com apoio do CREA-RJ.
O tema do ano foi direto ao ponto: “Saneamento e Segurança Hídrica: Desafios e inovações em um cenário de mudanças climáticas”. Segurança hídrica, aqui, é água suficiente e com qualidade para população, economia e ecossistemas, com risco aceitável a secas e cheias. No Rio, o debate pesa: dependência de transposições, pressão climática e a necessidade de equilibrar abastecimento e sustentabilidade.
No histórico do abastecimento, Fernández lembrou que a disputa por água acompanha a cidade desde 1565. “Estácio de Sá morre numa disputa pela água na foz do Rio Carioca. Hoje o Rio tem um processo plural, com vários players; se um falha, todo mundo é prejudicado. Setenta por cento da população do estado está no entorno da Baía de Guanabara. A insegurança hídrica da Região Metropolitana é uma bomba-relógio”, disse o engenheiro, citando o episódio de tolueno no sistema Imunana-Laranjal, que abastece mais de 2 milhões de pessoas em Niterói e São Gonçalo.
A crítica foi direta: faltam obras e gestão para a continuidade do serviço. “A gente normalizou algo absurdo, que é a suspensão do abastecimento por causa da manutenção. Não pode ser um sistema único; há necessidade urgente de redundância e isso tem que entrar na agenda das eleições do ano que vem”, destacou Miguel Fernández. Ele ainda cobrou atenção a instalações que beiram um século de operação. “Sistemas fortes não são os que nunca falham, mas os que não colapsam quando falham”, resumiu.
O painel foi moderado pela engenheira sanitarista Mickaela Midon (ABES-RJ e assessoria da presidência do CREA-RJ). Na mesa, diagnósticos sem rodeios. Lígia Maria Nascimento de Araújo, especialista em regulação de recursos hídricos e saneamento da Agência Nacional de Águas (ANA), alertou: “A cobertura de saneamento no país ainda é insuficiente e sem padrão de qualidade. A expectativa de redução da disponibilidade de água é de 30% a 40% em 2040”.
Da Secretaria de Ambiente e Sustentabilidade (SEAS), Ana Asti reforçou a pressão do aquecimento global e das perdas na rede. “Quatro em cada dez litros se perdem na distribuição, o que tende a agravar a escassez. A boa notícia é que as concessões ajudaram e a Baía de Guanabara vive momento de regeneração”, disse, lembrando o Plano Estadual de Segurança Hídrica (PESHE) já aprovado.
A advogada ambiental Monique Mello Frota (Fiocruz e diretora de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade da OAB-RJ) trouxe o impacto social: “Pesquisa em elaboração na Fiocruz mostra que a falta de saneamento é uma das principais causas de evasão escolar. A desnutrição decorrente compromete a aprendizagem”.
Em entrevista ao site do CREA-RJ, Renato Espírito Santo, diretor da ABES-RJ, definiu o SANEARio como passo de articulação técnica às vésperas da COP30, em Belém (PA). “Procuramos integração entre empresas e técnicos para destravar o desenvolvimento do saneamento”, afirmou. O presidente da ABES-RJ também apontou o desafio do novo marco do saneamento — que mira universalizar água e esgoto até 2033 — sob a sombra da crise de segurança pública. “As concessionárias precisam entrar nas comunidades; com a situação atual, cumprir metas fica muito difícil”, disse o engenheiro sanitarista.
Miguel Fernández também moderou o painel “Financiamento, inovação e sustentabilidade”, com Wanderson Santos (Secretaria de Infraestrutura do Rio), Frederico Lage (BNDES, saneamento ambiental), Paulo Canedo (Coppe/UFRJ – UNESCO) e Marcelo Sicri (Comlurb). O recado que atravessou os debates é prático: manter, duplicar rotas críticas de água, cortar perdas e preparar o sistema para falhas sem interrupção geral. Sem “backup”, o risco de apagão hídrico segue no radar.
Veículo: Online -> Site -> Site Diário do Rio/RJ