
Publicado em 02/07/2024 - 19:51 / Clipado em 02/07/2024 - 19:51
Asfalto, mais de uma inauguração por dia: a corrida do prefeito Eduardo Paes para entregar e divulgar obras até sexta-feira, dia 5; entenda por quê
Pressa tem razão de ser: de acordo com as regras do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a partir de 6 de julho candidatos à reeleição ficam proibidos de participar de inaugurações de obras públicas ou divulgação de prestação de serviços públicos
Por Carmélio Dias , Luiz Ernesto Magalhães e Selma Schmidt
Quem acompanha as redes sociais do prefeito Eduardo Paes já notou que nas últimas semanas ele pisou no acelerador na agenda de inaugurações ou anúncios de obras. A pressa tem razão de ser: de acordo com as regras do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a partir de 6 de julho, exatos três meses antes do primeiro turno das eleições municipais, agentes públicos — como é o caso de Paes, candidato à reeleição — ficam proibidos de participar de “inaugurações de obras públicas ou divulgação de prestação de serviços públicos”. Levantamento feito pelo GLOBO, com base na agenda oficial do prefeito e suas publicações no Instagram, mostra que, entre 15 de junho e 5 de julho, o prefeito terá participado de pelo menos 25 ações de entrega ou divulgação de obras. Mais de uma ação por dia, em média.
Só três de 44
Nem tudo, no entanto, será entregue por completo. Anteontem, acompanhado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o prefeito foi até a Favela do Aço, em Santa Cruz, para a inauguração da construção de três dos 44 blocos do projeto Morar Carioca, menos de 10% do total. Dezesseis famílias receberam as chaves e a documentação do imóvel durante a cerimônia. Ao todo, estão previstas 704 unidades, financiadas pela Caixa Econômica Federal. A previsão é que todas fiquem prontas só em 2026.
Na próxima sexta-feira, último dia do prazo estabelecido pelo TSE, Paes vai a Campo Grande — bairro mais populoso do Brasil, com 346.721 moradores, de acordo com o último censo do IBGE — inaugurar um mergulhão com 400 metros de extensão no cruzamento da Avenida Cesário de Melo com a Estrada do Monteiro. Embora importante, o trecho é apenas uma das nove frentes do projeto — que incluem a construção de dois túneis e a duplicação de várias vias. O Anel Viário só deve ser concluído no fim de 2025 a um custo estimado de R$ 1 bilhão, fruto de empréstimo do BNDES.
— É muita obra, e tem eleições chegando. Só vou acreditar que é para valer se não parar depois de outubro — diz o vendedor Paulo Viegas, de 52 anos, que trabalha numa loja em Campo Grande.
E não para por aí. No dia 23 de junho, o prefeito entregou parcialmente as obras do programa Bairro Maravilha da Vila Vintém, em Padre Miguel, na Zona Oeste. Das 36 ruas do projeto, apenas 11 foram concluídas. Uma semana antes, no dia 16 de junho, Paes inaugurou a pavimentação de 12 ruas na comunidade Vinte e Nove de Março, em Cosmos. Neste caso, ficaram faltando só três vias.
Boa parte das inaugurações de Paes nesta reta final da limitação imposta pelo calendário eleitoral está concentrada na Zona Oeste. Não por acaso, a região tem alta densidade populacional e, consequentemente, eleitoral.
Anteontem, por exemplo, o prefeito se deixou filmar andando de bicicleta pela Avenida Engenheiro Souza Filho, entre a Muzema e Rio das Pedras, também na Zona Oeste, onde havia acabado de inaugurar obras de drenagem e pavimentação a um custo de R$ 34,7 milhões. Antes disso, no dia 15 de junho, já havia inaugurado o Parque Susana Naspolini, em Realengo.
Para Mayra Goulart, professora do Departamento de Ciência Política da UFRJ, a concentração de inaugurações numa área da cidade densamente povoada e no limite do que permite o calendário do TSE obedece à natureza da dinâmica eleitoral.
— Ao priorizar a Zona Oeste, o prefeito visa aos bairros com mais eleitores e onde ele tem maior potencial de crescimento. Em Campo Grande, por exemplo, ele conquistou 22% dos votos do bairro no primeiro turno de 2022, o que, embora seja um bom percentual, mostra que há margem para crescer — diz Mayra Goulart. — Isso acontece independentemente da agenda política ou ideológica do candidato. Ele precisa de um mandato para colocar em prática suas políticas, então a dinâmica eleitoral precede as outras. A estratégia eleitoral dirige a performance de um político.
Foco onde pode crescer
Estudo do Laboratório de Partidos, Eleições e Política Comparada (Lappcom) em parceria com a Coppe/UFRJ, coordenado por Mayra Goulart, mostra que, no ranking da votação de Paes no segundo turmo das últimas eleições municipais, levando-se em consideração o percentual de votos de cada bairro conquistados por ele, Campo Grande, por exemplo, aparece na 146ª posição — dos 163 que a cidade tem atualmente, segundo dados do Índice de Progresso Social do Rio, de 2022. Outros bairros da região vão na mesma direção: Paciência (145ª posição), Bangu (141ª), Realengo (128ª), Santa Cruz (120ª) e Taquara (81ª), o que reforça a noção de que a região concentra potencial de crescimento eleitoral para o prefeito.
Na corrida contra o tempo, vale até a programação de eventos para marcar a fase inicial de uma obra. Fechada há 22 anos, tombada como patrimônio histórico e há tempos em processo de deterioração, a Estação Ferroviária Barão de Mauá, conhecida como Leopoldina, na Avenida Francisco Bicalho, deve renascer apenas no fim de 2026, quando completa cem anos. O pontapé inicial das obras de restauração, orçadas em R$ 80 milhões, seria dado ontem, mas foi adiado em função da chuva. Sem tempo a perder, a prefeitura já remarcou tudo para hoje.
A restauração da estação é a primeira etapa de uma série de intervenções que a prefeitura pretende realizar no terreno de 125 mil metros quadrados da Leopoldina. Nas fases seguintes, ainda sem prazo, serão construídas a Fábrica do Samba — uma segunda Cidade do Samba, para abrigar as agremiações da Série Ouro do carnaval carioca —, um centro de convenções e 700 unidades de habitação popular do programa Minha Casa, Minha Vida. No fim de fevereiro, foi fechada uma parceria entre a União, dona do espaço, e o município. A gestão da estação e dos terrenos vizinhos foi transferida para a prefeitura.
Caminho livre
O esforço para fazer bonito em ano eleitoral inclui ainda uma turbinada no orçamento do programa Asfalto Liso, da Secretaria municipal de Conservação, criado com o objetivo de revitalizar mais de 450 quilômetros de vias da cidade até o fim deste ano. Em 2022, a prefeitura desembolsou R$ 184,1 milhões; em 2023, R$ 249 milhões, e este ano o valor saltou para R$ 416,3 milhões. Nesses dados não estão os recapeamentos feitos dentro do projeto Bairro Maravilha, que também implanta redes de águas pluviais e coloca asfalto novo, no caso da Zona Oeste.
Além de acelerar os gastos, as inaugurações e os anúncios, o prefeito do Rio tem buscado reafirmar sua parceria com o governo federal, investindo pesado na boa relação que tem com o presidente da República a despeito de certo impasse político com PT fluminense, que insiste em indicar o vice na chapa de Paes. A presença de Lula na inauguração de uma pequena parte do Morar Carioca em Santa Cruz esta semana e a cerimônia preparada para marcar o início das obras na Estação Leopoldina — fruto direto de parceria estabelecida com a União — são exemplos disso.
Perguntado, ontem, sobre a enxurrada de inaugurações concentradas no período pré-eleitoral, Paes foi econômico na resposta:
— É isso mesmo. Muita entrega. E ainda vão acontecer outras sem a minha presença.
Veículo: Online -> Portal -> Portal O Globo - Rio de Janeiro/RJ