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Portal O Globo - Rio de Janeiro/RJ

Publicado em 12/03/2024 - 11:12 / Clipado em 12/03/2024 - 11:12

Equipamentos recolhidos, empresa sem representante na cidade e 'jogo de empurra': veja os obstáculos à investigação de jovem eletrocutado em festival no Rio


João Vinícius Ferreira Simões, de 25 anos, sofreu uma descarga elétrica durante o I Wanna Be Tour, no Riocentro, no último sábado


Por Carolina Callegari , Giulia Ventura , Geraldo Ribeiro , Thayná Rodrigues e Roberta de Souza — Rio de Janeiro

 

Enquanto a família do universitário João Vinícius Ferreira Simões, de 25 anos, enfrenta a dor da perda do jovem, eletrocutado sábado num festival de música no Riocentro, na Barra, as investigações esbarram numa série de obstáculos. A perícia no espaço onde a vítima sofreu o choque foi prejudicada porque todos os equipamentos foram recolhidos — por isso, o local da descarga elétrica e a situação da instalação ainda são um mistério. E os organizadores do evento, da empresa 30e, também não foram ouvidos pela polícia porque voltaram para São Paulo sem prestar esclarecimentos e não há representantes no Rio.

Testemunhas contaram que o rapaz foi eletrocutado ao encostar num food truck. Estudante de educação física, João tinha saído de Maricá, na Região Metropolitana, onde mora, para assistir, sozinho, ao festival I Wanna Be Tour. Desesperados com a morte, os pais do jovem foram até o local do evento no domingo e dizem ter visto muitos fios soltos.

Como não havia câmeras de monitoramento no espaço, os investigadores da 32ª DP (Taquara) pedem para que quem tiver qualquer informação sobre o caso entre em contato com a delegacia pelo telefone (21) 98596-7230. Os agentes já intimaram a depor os funcionários da 30e. Numa rede social, a empresa informou que, “durante a chuva, o público se dirigiu para a marquise coberta, seguindo os protocolos de segurança. Neste momento, na área descoberta, o jovem foi atingido por uma descarga elétrica”. Acrescentou que lamenta a morte de João e que estabeleceu um primeiro contato com a família do jovem.

 

‘Despreparo’

Duas testemunhas ouvidas pelo GLOBO afirmaram que, assim como o universitário, também levaram choques no local. Formado em eletrotécnica, Rodrigo Motta, de 33 anos, disse que verificou fios sem aterramento no local e que até avisou a funcionários e seguranças do evento sobre o risco de acontecer “algum problema muito grande”. Uma jovem, que se identificou apenas como Júlia, contou ter levado um choque ao encostar numa mesa de metal que estava junto a um food truck e que informou aos funcionários o que tinha acontecido:

— Eu falei: “Tem que avisar à manutenção”. Eu o vi falando pelo rádio. Se ele estava falando com alguém de verdade, eu não sei. Agradeci e ele também. E ficou por isso mesmo.

Já o autônomo Vinicius Bragança, de 33 anos, viu quando João estava inconsciente no chão. Segundo ele, a primeira pessoa a fazer massagem cardíaca na vítima estava na plateia e que funcionários estavam desorientados sobre como proceder.

— Só desligaram a energia dos food trucks 15 minutos depois e isolaram a área com lixeiras. Muito despreparo e imperícia — disse o morador de Niterói.
 

Família pede justiça

Roberta Isaac Ferreira, mãe da vítima, contou que soube no Instituto Médico-Legal (IML) que o filho tinha uma marca nas costas provocada por um condutor elétrico. Ela criticou a falta de segurança num show no Riocentro

— Meu filho pagou ingresso caro para um evento que deveria ser seguro, mas não foi.

Durante o velório, em Maricá, Roberta disse que chegou a enviar um e-mail para os organizadores do evento cobrando uma resposta para o que aconteceu a seu filho, mas que não tinha recebido resposta. O avô do rapaz, Roberto Ferreira, criticou o que chamou de “ganância” dos empresários de shows que não se preocupam com a segurança do público. Já o pai do estudante, Roberto Simões, passou a maior parte do tempo em silêncio ao lado do caixão.

— Não quero achar culpados. Só não quero que aconteça o mesmo a outras pessoas. Dava tudo para estar no lugar dele. Não sei como vai ser daqui para frente — desabafou.

João cursava o sétimo período de Educação Física e, segundo a mãe, fazia estágio como personal trainer. O sonho dele era, após se formar, fazer uma pós-graduação. Solteiro, havia terminado um longo namoro, que durou nove anos.

 

Responsabilidade

O evento teve a autorização do Corpo de Bombeiros. De acordo com a corporação, agentes estiveram no local do show fiscalizando, “entre outros pontos, a adequação dos postos médicos e das ambulâncias de pronto atendimento ao público”. As instalações elétricas, entretanto, não foram verificadas pelos bombeiros, pois, segundo o órgão, essa função é de responsabilidade do engenheiro que assinou as Anotações de Responsabilidade Técnica (ART), contratadas pelos organizadores.

O Conselho Regional de Engenharia e Agrononia (Crea-RJ) informou que, para funcionar, todo food truck precisa ter um engenheiro responsável que assine a ART. A entidade afirmou que não tem a função de fiscalizar serviços, mas que está apurando a responsabilidade técnica dos profissionais, cujos nomes não foram divulgados.

O Riocentro, onde o evento foi realizado, é um espaço da prefeitura que está concedido à iniciativa privada. Procurado, o município informou que o evento cumpriu todas as exigências para ser realizado, que inclui a apresentação da autorização do Corpo de Bombeiros e a autodeclaração sobre o cumprimento das normas estaduais de segurança.

 

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