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Portal O Globo - Rio de Janeiro/RJ

Publicado em 22/03/2023 - 12:43 / Clipado em 22/03/2023 - 12:43

Asfalto Liso: inspeção do TCM aponta falhas em serviço do programa da prefeitura do Rio


Ações preveem investimento de R$ 580 milhões em 290 dos principais corredores viários da cidade

Por Luiz Ernesto Magalhães — Rio de Janeiro
 

O sinal de alerta foi aceso nas intervenções do programa Asfalto Liso da prefeitura do Rio, que prevê investimento de R$ 580 milhões na recuperação de 290 dos principais corredores de trânsito da cidade até 2024. Uma inspeção feita pelo Tribunal de Contas do Município (TCM), em parceria com a Coordenação de Programas de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe), da UFRJ, identificou o que considera falhas na execução do recapeamento de rua da Zona Sul, bem como observou desgaste prematuro em serviços feitos na Barra da Tijuca e na região da Leopoldina. Os problemas, na avaliação dos técnicos, podem onerar o próprio poder público com mais despesas para manter as vias em bom estado e até mesmo expor a população ao risco.

As informações constam de um relatório de acompanhamento do programa, aprovado pelo TCM no fim de agosto. O documento fundamentou o voto do conselheiro David Carlos Pereira Neto, que fez uma série de observações e recomendações à Secretaria municipal de Conservação (Seconserva). Entre as medidas propostas está a implantação de um cadastro que indique as datas exatas do início e do término das intervenções, como uma forma de monitorar a durabilidade do asfalto.

O banco de dados pode permitir, por exemplo, que o governo cobre das empreiteiras a restauração de trechos que apresentem problemas dentro do prazo de garantia (de cinco anos). Como esse controle não é feito hoje, a auditoria identificou casos em que a prefeitura teve gastos adicionais ao contratar outros fornecedores para reparar defeitos.

Gastos de R$ 148 milhões em 71 vias
No estudo, a análise foi feita por amostragem. Só a fatia do programa que inclui 71 vias da Zona Sul, da Grande Tijuca e do Centro prevê gastos de R$ 148 milhões. Há outros três lotes em andamento. Técnicos da Coppe encontraram problemas na Rua Mário Ribeiro.

Na semana passada, uma equipe do GLOBO percorreu 18 vias cobertas por esse contrato. A situação ainda não mudou muito na maioria dos trechos, já que, em grande parte, as obras sequer começaram. Duas vias já foram contempladas: a Avenida Padre Leonel Franca, na Gávea, e a Rua Mário Ribeiro, no Leblon, onde foram observados problemas apenas em um bueiro ligeiramente desnivelado, em frente ao Hospital Miguel Couto.

— O que espero é que a obra seja para valer. Já torci o pé duas vezes atravessando a rua apenas esse ano. Fiquei quase dez dias de licença em um desses casos — diz a professora Joaniza Cavalcanti Sobrinho, de 56 anos, moradora da Rua Santa Clara, em Copacabana, que ainda não entrou em obras.

O motorista de aplicativo Arthur Alberto, de 36 anos, por sua vez, reclama do asfalto da pista lateral da Avenida Presidente Vargas, desgastada principalmente pelo tráfego de ônibus que usam a via para acessar a Francisco Bicalho:

— Se não prestar atenção, não tem suspensão de carro que dure.

Compactação fora dos padrões
O trabalho da Coppe ressalta justamente que, na via analisada, a compactação do solo estava fora dos padrões esperados para suportar a passagem de veículos sem deterioração precoce. Além disso, a massa asfáltica nem sempre se encontrava na temperatura ideal para aplicação. As normas técnicas indicam que, entre o momento de fabricação em usinas especializadas e a colocação no solo, não devem se passar três horas, como admitiu a Seconserva em documento enviado ao TCM. No entanto, em algumas amostras, os técnicos descobriram que a espera chegou a sete horas.

As conclusões tomaram como base amostras de dez pontos do pavimento que havia sido recém-recuperado no trecho da Rua Mário Ribeiro, entre as avenidas Bartolomeu Mitre e Visconde de Albuquerque, no sentido Barra da Tijuca. Por dia, a via recebe cerca de 68 mil veículos (nos dois sentidos). Uma das questões levantadas pelo estudo é a dificuldade de controlar a qualidade do serviço em ruas e avenidas com perfis e volumes de tráfego distintos.

“Em relação a efeitos e riscos, as principais consequências passíveis de ocorrer relacionadas à situação encontrada são: possível agravamento da degradação e do estado de conservação do pavimento, devido à execução da obra sem projeto e sem controle tecnológico adequados, e risco de danos à integridade física dos cidadãos usuários da via, tendo em vista a degradação precoce no pavimento”, diz um trecho do relatório.

Os técnicos avaliaram que, apesar dos problemas, a empreiteira fazia ensaios próprios sobre a qualidade do material colocado, seguindo as normas de controle previstas. Em nota, a Dimensional Engenharia, que executa as obras, discordou das observações do TCM em relação à comparação dos serviços que executa hoje com intervenções mais antigas, feitas por outras empresas. “A Dimensional questiona a metodologia e a representatividade da amostragem analisada pelo relatório”, diz a nota. “Além disso, todo o processo de trabalho da empresa é checado por equipamentos laboratoriais de ponta, aferidos pelo Inmetro”, concluiu.

Relatório sob análise
Também por nota, a Seconserva informou que o relatório do TCM está sob análise da equipe da Coordenação de Tecnologia e Pavimentação “a fim de que os pontos da auditoria sejam respondidos e as oportunidades de melhoria sejam atendidas no que couber”. A secretaria acrescentou que supervisiona a execução dos serviços e que, após a inspeção do TCM, a Mário Ribeiro recebeu uma segunda camada de asfalto.

Os problemas na qualidade dos serviços não surpreendem o engenheiro Luiz Carneiro de Oliveira, coordenador da Câmara Especializada de Engenharia Civil do Conselho Regional de Engenharia (Crea).

— Se o asfalto não dura como o esperado, é porque há falhas na fiscalização do contrato de execução das obras por parte da prefeitura. Um problema que temos visto é que, se o solo não for bem compactado, os defeitos logo tendem a aparecer, porque as vias não comportam o peso dos veículos — disse Luiz Carneiro.

O presidente do Instituto Brasileiro de Perícias de Engenharia (IBPE), Clémenceau Chiabi Saliba Júnior, observa que alguns cuidados devem ser tomados em especial na medição da temperatura da massa asfáltica antes da colocação no solo:

— O ideal é fazer medições da temperatura pouco antes da aplicação. E, caso os defeitos só sejam identificados tempos depois da execução da intervenção, é até difícil indicar um responsável pelo problema.

Em nota, a Dimensional Engenharia informou que é responsável apenas pela Rua Mário Ribeiro e questionou a metodologia e representatividade da amostragem analisada no relatório. A empresa ressaltou que, na conclusão do próprio TCM, o tribunal observa que a Dimensional segue os controles tecnológicos preconizados na norma, que a suposta não conformidade se aproxima dos limites da norma e que os ensaios realizados pela empresa atendem a norma. E empresa diz que não concorda com o diagnóstico da irrelevante “não-conformidade”. Além disso, todo o processo de trabalho da empresa é checado por equipamentos laboratoriais de ponta, aferidos pelo Inmetro.

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